Introvertendo 66 – Quando o Autismo Ataca?

Piadas com autismo ainda são frequentes e certamente são ofensivas para autistas, seus familiares e amigos. Neste episódio do Introvertendo, investigamos o porquê autistas ainda são estigmatizados por este tipo de humor, qual abordagem humorística sobre o autismo é saudável e os casos de ofensas a autistas que ganharam notoriedade nacional.

Participam desse episódio Luca NolascoTiago Abreu.

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Transcrição de episódio

Tiago: Olá pra você que escuta o podcast introvertendo e não ri de piadas sobre autismo. Meu nome é Tiago Abreu.

Luca: Meu nome é Luca Nolasco e olá também pra você que não faz piada sobre autismo.

Tiago: Hoje nós vamos discutir um tema bastante problemático, cujo título que a gente utilizou é “quando o autismo ataca” para falar sobre os problemas que cercam piadas com autismo, até ofensas que estigmatizam esse grupo pelo qual nós pertencemos.

Bloco geral de discussão

Luca: Então Tiago, acho que você já deve ter visto que para grande parte das pessoas, problemas de cunho psiquiátrico são temas para piada né. Eu acho que compensa muito a gente começar falando sobre isso porque pelo menos dá uma introdução boa para o tema. O que você teria para falar sobre isso?

Tiago: A questão da dificuldade né que vem de origem psicológica, ela socialmente tem um problema, inclusive um autor da sociologia do qual eu não li muito profundamente, mas eu já vi muitas pessoas inclusive usando como referência que não sei se é Goffman, me corrijam se eu estiver errado, que ele inclusive tem trabalho sobre o conceito de estigma, que é uma série de digamos assim de características que não correspondem necessariamente a realidade, mas que ficam presos àquela pessoa a partir do rótulo do qual ela está em volta. E eu acho que falar de estigma é o ponto central quando a gente fala sobre piadas, sobre ofensas que envolvem grupos sociais. Existem pessoas que não usam isso necessariamente com a mentalidade “olha isso é para ofender”, tem gente por exemplo que fala “eu sou muito bipolar” “ai, eu tenho um TOC, eu sou meio esquizofrênico”. Tem muita gente que usa isso até com piada, às vezes a pessoa não tá nem com intenção necessariamente de ofender pessoas que têm esses diagnósticos, mas se atribuiu tanto o sentido valor àquelas palavras,  então se a pessoa tem TOC, a pessoa é perfeccionista, a pessoa é perfeccionista porque ela tem TOC, essa pessoa ela tem uma mente muito criativa e às vezes ela tem os momentos meio estranhos é esquizofrênica, ah eu altero meu amor muito, um dia estou feliz no outro não, eu sou bipolar. Então, tem sempre esses atributos de valor, e eu acho que o autismo ganhou um sentido digamos assim de isolamento, então qualquer coisa que você fala que é uma atividade solitária, ou que você tem uma trajetória solitária ou qualquer coisa também que tem relação a loucura,  falar “eu tô muito autista hoje”. Se você faz uma busca no Twitter pela palavra “autismo”, “autista”, você vai ver cada porcaria publicada dia a dia; e teve um dia que eu fiz esse experimento social, eu tenho uma conta pessoal que tem um nick diferente, não tem nada a ver com meu nome justamente pras pessoas não procurarem, porque eu só posto porcaria e aí onde eu falei: Vou fazer o experimento social, entrar na busca do Twitter, pesquisar por “autismo”, “autistas” e responder comentários negativos, e era muito engraçado porque a pessoa faz um comentário assim como se autista fosse um psicopata, aí eu respondi perguntando “você acha que autistas são psicopatas?”, sabe, uma coisa assim bem provocativa mesmo, e algumas pessoas recuavam, e outras pessoas respondiam grosseria, achando sim tipo “eu estou no meu direito de usar os autistas, usar esse grupo de pessoas para fazer piadinhas ao meu bel-prazer”. 

Luca: Muitas pessoas, apesar de não fazerem com maldade, fazem esse tipo de piada com uma certa perversão, no sentido de que no caso do bipolar por exemplo, pela pessoa, na verdade é uma visão da pessoa, só explicando, porque a pessoa bipolar não sofre muito problemas, afinal de contas ela só fica feliz e fica triste, eu posso fazer muito bem piada porque isso não afeta a vida dela. Bom, isso é claramente um desconhecimento e afeta sim a vida de muita gente, só que essa é uma visão que eu já vi repetida várias vezes, isso se aplica ao autismo também, pelo desconhecimento do que é o autismo, muitas pessoas acabam fazendo piadas, achando que ou é aquela visão extremamente estereotipada, ou é só uma coisa que eu posso fazer graça porque não afeta de verdade a vida das pessoas, então por que que eu não poderia fazer piadas no meu direito? Bom, você tá, só que não tá sendo uma pessoa muito legal nem moralmente legal, enfim, não é o que você deveria fazer. Qualquer pessoa que já frequentou ou já pelo menos olhou basicamente qualquer rede social com ênfase em 4chan da vida, ou alguns grupos específicos de Facebook, vê que no meio jovem, especificamente de jogos, é muito comum autismo como adjetivo pejorativo para pessoa que é incapaz de realizar tal tarefa, uma pessoa truculenta pelo simples fato de ser algo que acham engraçado, e depois se tornou até uma uma gíria coloquial, sem sem nenhum valor por trás dela só um pronome de tratamento que é bem preocupante, porque isso consigo traz a consequência de quanto mais pessoas ouvindo mais pessoas vão repetir e menos pessoas terão uma noção do que de fato é o autismo. Quando uma pessoa se identifica como autista, maior vai ser o peso que ela vai ter que carregar nas costas por conta desse estereótipo. Isso é muito ruim, uma consequência final do bastante preocupante.

Tiago: No ano de 2018, em parceria com a Liga dos autistas, quem não conhece procura depois no Instagram, eles têm um perfil eles são grupos organizados de várias pessoas diagnosticadas que produz conteúdo, que produz coisas até baseados na área de humor, mas usando o autismo não do ponto de vista para ser uma chacota, e sim para falar das experiências deles e criar humor com isso. O Dácio Júnior, que é uma das pessoas desse grupo, ele escreveu um artigo que inclusive foi publicado no introvertendo, vai ter o link chamado: o poder do humor, e aí um dos argumentos que ele trabalha nesse artigo que eu acho bastante interessante é que a representação do autista no meio televisivo, na cultura pop de certa forma, também ajudou muito a criar essa ideia não do autista que cria coisas engraçadas, que se envolvem em situações engraçadas, mas o autista que é piada nessas situações; então quando a gente falou lá no episódio 36, que foi o episódio sobre a série Atypical, eu entrei um pouco por cima desse assunto, de que muitas vezes os personagens que tem alguns problemas digamos psicológicos em séries e tudo mais, eles são inseridos para ser um alívio cômico, você não ria das coisas das quais os personagens são envolvidos, você ri deles. Um exemplo muito claro é o Sheldon Cooper, que ele é um personagem teoricamente com altas habilidades que também algumas pessoas falam que ele é um personagem autista, ele é um personagem arrogante, que as pessoas muitas pessoas criam aversão a ele e muitas vezes ele está nas situações, nas histórias para as pessoas rirem dele e acharem idiota, seja pelas coisas erradas que ele faz, pelo que ele fala então eu acho que ao longo da cultura popular isso sempre foi muito incentivado né; isso se você considerar também que nessa cultura de internet nós temos várias referências ao autismo que sempre são pejorativas. E se a gente for falar de meios né, da internet, um deles é o YouTube. Os youtubers famosos, eles geralmente apresentam de vez em quando alguma piada que estigmatiza certos grupos de pessoas, incluindo autistas. E aí com base nisso, eu achei uma discussão no fórum Reddit no final de 2018 que foi um cara que falou uma coisa muito interessante,  eu vou até reproduzir aqui, mas o link vai estar no nosso site, então se você quiser ver tudo isso que a gente está falando é só acessar os links que dizem o seguinte: vou desabafar aqui uma coisa que me aborrece como uma pessoa com autismo, são as piadas que fazem sobre ele; usam esse termo para designar uma pessoa leiga, para não dizer estúpida, isso me faz sentir subestimado. Uso esses espaços como desabafo sobre como eu vejo isso e que opinião vocês teriam sobre ou se passam uma situação semelhante, e algumas pessoas vão falando de séries e perguntando se as características demonstradas nessas séries correspondem de fato o que as pessoas dentro do espectro são. Sobre os youtubers, é um comentário que achei interessante e vem logo após, é um cara falando: sim, minha priminha de 6 anos faz piadas com depressão e autismo constantemente, ela nem sabe o que realmente são, acha que é uma doença de gente isolada e não vê problema em rir, isso porque ela viu youtubers, amigos e a mídia falando coisas do gênero, então é uma coisa muito preocupante.

Luca: Vale lembrar, que para muita gente, a única referência do que é o autismo, é o Sheldon Cooper, é o YouTube, é a série de TV. E isso traz preocupação, porque nem sempre a pessoa é assim estereotipada daquela maneira, ou nem sempre a pessoa tem sequer aquelas características. Quem for se basear no Sheldon Cooper pra descrever uma pessoa, vai estar descrevendo um ermitão, não tá descrevendo um autista, está descrevendo uma pessoa completamente fora da realidade, ninguém é daquele jeito de verdade; isso quando exacerbado, como tudo no YouTube é, tudo no YouTube tem aquele aquela carga de quando algo aparece, aparece aos baldes, em diversos vídeos, em quantidades imensas, traz consigo resultados extremamente nocivos, por que o YouTube é uma plataforma imensa, uma plataforma com poder de  “educação”, poder de formação muito grande, muito presente na vida de qualquer pessoa, você provavelmente usou YouTube hoje ou vai usar hoje ainda, então o que as pessoas que produzem para ele ele dizem, ou pensam, importa muito não só para a plataforma, com para quem escuta. Se a pessoa que produz conteúdo, ele tem essa visão estereotipada, visão até suja do que é o autismo, as pessoas que vão assistir provavelmente terão aquela visão, principalmente se forem mais novas, porque não vão ter nenhuma outra perspectiva do que é, isso fomenta mais ainda aquele tipo de brincadeira que dá até o nome do título, quando autismo ataca. Ataca como? O que é atacar para essas pessoas? Atacar simplesmente é você agir da maneira mais tosca e reclusa possível, porque assim você tá sendo muito autista? O que que é ser muito autista? Não sei o que é, eu sou e não sei o que é ser muito autista. Então, o que vocês acham que é?

Tiago: Além de tudo, quando eles falam “quando o autismo ataca”, parece que o autismo é uma válvula, um interruptor de lâmpada que quando você liga ativa alguma coisa, essa coisa acontece, depois você vai lá e desliga.

Luca: Também é visto como se fosse algo como estresse, que algo que você vai passando por situações que te incomodam até chegar num ápice, onde você explode e não aguenta mais e tem atitudes difíceis de lidar. Não é assim, o autismo é seu molde, você é autista porque você tem essa configuração de fábrica, não é algo que vai aumentando com o tempo ou diminuindo com o tempo, como muita gente de meios religiosos acredita que pode ser. Não é assim. E a desinformação faz parecer que é, e é muito fácil do autismo “atacar” né, afinal de contas a gente tá sendo “muito autista por falar isso” a gente “tá sendo muito autista por reclamar de coisas tão toscas assim”. Bom, eu acredito que não, porque é algo que me afeta. Muito provavelmente afeta quem está escutando, ou algum conhecido de quem está escutando também.

Tiago: Eu acho que essa questão também nos leva a um tema muito forte e que não é tão conversado quando o assunto é autismo, que é o quanto que o autismo se tornou um tema popular porque a cultura nerd já tá certa forma há uns 10 anos em alta. Antigamente ser nerd era um julgamento negativo, você usava o termo Nerd no período escolar para escolher aquele cara que tirava boas notas mas que era feio, desajeitado, sem graça, e hoje a cultura nerd ela movimenta milhões, bilhões no mundo seja em filme, seja em produções, seja em quadrinhos. Então hoje o que é nerd geek, nerd certa forma, também se misturaram e junto com isso vem o autismo, porque o quando o autismo não é visto como algo extremamente negativo, ele é visto como uma característica dos super-heróis sabe, uma coisa superior; e as duas noções elas prejudicam, porque elas não correspondem à realidade. E aí com isso você tem diagnóstico errados, muita gente que quer se enquadrar como autista, ou gente que acha que “ah, eu gosto de ficar no meu quarto, eu não suporto as pessoas com que eu convivo, então eu sou autista e eu odeio pessoas”, e autistas não odeiam pessoas. Na verdade, a grande maioria dos autistas que eu conheço não odeiam pessoas, eles só tem dificuldade de entender ou de lidar com elas.

Luca: Os meios midiáticos sempre procuram alguma característica para ter “como sua”, porque essa característica vai ser o carro-chefe, que faz os produtos venderem, que faz as pessoas quererem ser assim, consumir mais. Há muito tempo, essa característica era ser o homem viril, a mulher com aparência perfeita; e até hoje esse último continua sendo muito presente. Esses são os que são as pessoas que são mais atraentes, que são mais produtivos, que são mais tudo, só que recentemente Isso mudou um pouco de característica, porque, pelo menos na minha visão, isso não se enquadraria mais o mundo de hoje, que tem um foco em tecnologia muito grande, então o ideal passou ser a pessoa nerd, a pessoa que tem o conhecimento, a pessoa que tem a capacidade de resolver tudo pela internet, a capacidade de ter a sacada genial, Steve Jobs, o Bill Gates, a pessoa com a sacada. E de cinco anos para cá, as pessoas perceberam que existe o autismo, e vem ele, pelo menos no meio midiático, como o Apogeu do nerd, uma deturpação do nerd tão grande que chega a ser mais mais efetivo do que ele é, mais inteligente do que o cara né, ele é mais produtivo que o cara nerd, ele é mais tudo que o cara nerd. Mas tem um “lado ruim, que ele não sabe falar com pessoas”, ou ele não entende pessoas. Não é assim, e isso de fato prejudicou muito a visão de como as pessoas têm autismo, porque quem é autista não é necessariamente inteligente, não é necessariamente bom em alguma coisa. Tem com certeza alguma predileção, algum favoritismo de conteúdo, mas não é uma pessoa excepcional em tudo, não é a pessoa excepcional em qualquer coisa as vezes. E isso traz consequências consequências que podem ser graves. Porque um adolescente que ver esse conteúdo pensa “nossa como eu tenho dificuldade com pessoas porque eu estou passando por uma fase difícil eu com certeza sou autista, porque eu não gosto de ninguém, porque eu sou tão bom em matemática, sou obviamente autista” e isso esse tipo de Diagnóstico errado traz consequências concretas para a pessoa, se não tiver nenhum contestamento médico porque a pessoa traz as características para si mesmo, a pessoa muda si mesmo para ter uma confirmação social de “ah, eu sou tão autista, eu sou tão inteligente, eu sou tão brilhante”. E por outro lado do espectro tem pessoas que de fato são autistas, só que não se identificam com nada do produto midiático. Por exemplo, eu mesmo. Eu não consegui me ver como autista antes de ter o diagnóstico, é até um pouco depois, porque eu não me vejo com uma pessoa excepcionalmente inteligente, não vejo uma pessoa excepcionalmente reclusa, uma pessoa, para repetir a palavra, com excepcionais dificuldades sociais. Não vejo nada disso, nada que eu veria o Sheldon Cooper por exemplo ter. Então como que eu sou autista, se eu não tenho esse tipo de característica? Ninguém me respondeu, mas no final cheguei à conclusão de que é porque eu não preciso ter esse tipo de característica, porque elas sequer existem de verdade. Isso é só deturpação Hollywoodiana de características básicas, que se as pessoas tivessem conhecimento do tema não seria problemático, só que elas não tem, então é problemático sim. As pessoas vão me fazer piadas sobre coisas que elas não conhecem. Uma pessoa, ela com certeza no dia de hoje faz muita piada com depressão com suicídio, com qualquer coisa até ela ver isso de perto. Se ela tiver uma experiência de parente que suicidou, ou uma tentativa suicídio, de um diagnóstico de depressão, de um tratamento de depressão, ela jamais faria piada com isso, porque ela sabe sofrimento e dificuldade que é. O mesmo é para autismo. As pessoas fazem piadas com isso não conhecem, as pessoas fazem piadas com isso que nunca viram de perto, e até por falta de exposição midiática verossímil. A partir do momento que elas virem como de fato é, elas vão ver que o conceito delas tá errado, a piada delas sequer tem sentido, não tem graça porque a graça disso está no sofrimento de outra pessoa. Só as pessoas mais sádicas e vis notariam isso e não se importariam, mas a maioria das pessoas teria a percepção de que não é legal isso. Só que falta o conhecimento básico, isso não é culpa das pessoas. Isso é culpa da falta de acesso, que impede que as pessoas tenham perspectiva real do autismo.

Tiago: Eu acho que uma coisa muito importante nós falamos ainda nesse episódio para finalizar são casos de piadas com autismo que ocorreram repercutiram, ou ofensas diretamente ligadas ao autismo nos últimos anos que pegaram muito mal. O primeiro caso que eu consegui encontrar foi em 2011 quando a MTV fez uma espécie de quadro né no Comédia MTV que era A Casa dos Autistas. A Casa dos Autistas foi ao ar no mês de março de 2011. Nós estamos gravando esse episódio em março de 2019, ele vai sair muitos meses provavelmente depois, então tem 8 anos que isso saiu, e isso pegou muito mal por que viralizou no YouTube. O YouTube tava ali estabelecendo como seu espaço e aí teve até abaixo-assinado de movimentos de autismo fazendo posições públicas de críticas sobre isso, e o conteúdo desse Dessa Casa dos Autistas era trazer atores com características estereotipadas e fazendo piadas com essas dificuldades, então era algo de bastante mau gosto. Só lembrar que a MTV fechou as portas em 2013.

Luca: Eu fico feliz de isso ter acontecido em 2011 e não nos dias de hoje, porque isso mostra que apesar de ter sim ocorrido, e isso é péssimo, pelo menos não é algo tão recente assim. Óbvio que nos dias de hoje continuam a acontecer de diversas piadas, mas pelo menos no meio mais formal da mídia, que é a televisão, isso é algo que tende a ocorrer muito menos. Infelizmente não tem exatamente como regular o que as pessoas que produzem para o YouTube, por exemplo, vão dizer ou fazer, e é até correto que não se regule isso de maneira estrita, só que o lado ruim disso é que as pessoas vão falar coisas que elas pensam e isso pode muitas vezes englobar diversos preconceitos. Um deles é sobre autismo. Mas eu fico muito feliz de nos dias de hoje é muito raro ter uma notícia tipo essa, de uma produção da TV ter uma quantidade tão enorme e tão insultante de esteriótipos toscos.

Tiago: E um caso que ocorreu em 2019, inclusive para nós que estamos gravando episódio muito antes é algo extremamente recente, que foi o caso da conselheira do Flamengo que fez uma série de ataques usando o seu Twitter. Novamente, eu acho que a rede social que mais junta ofensas contra autistas na internet, chamando os jogadores de LoL do time de LoL do Flamengo de “nerds autistas da pior espécie”, e isso pegou bastante mal para ela. Isso ocorreu no final de Fevereiro deste ano (2019), a conselheira do Flamengo chamada Marion Kaplan ela, digamos assim, ficou bastante “ofendida” no aspecto pessoal mesmo com o fato do time de futebol feminino, e também de alguns outros tipos de esportes Olímpicos do Flamengo receber um pouco investimento pouca visibilidade, e o fato do time de LoL ter alcançado um destaque mesmo sendo relativamente recente, e ela nesse processo de indignação usou a conta dela no Twitter e disse coisas péssimas.

Luca: Bom, aí ela juntou diversos conceitos extremamente errados com o único intuito de insultar, por diversas razões, no caso dela por revolta, o que não justifica absolutamente nada, torna apenas pior, porque mostra que ela de fato pensa isso, que ela não tem apenas um conceito errado, ela queria insultar, porque no conceito dela chamar de autista é o pior possível para a situação. Eu vejo isso como algo que, muitas pessoas disseram que ela precisa de tratamento, eu vejo com ela precisaria de consequências legais, na questão de processo para se ver que isso é um tema que não se deve tratar com essa indelicadeza, de maneira tão rude, porque são pessoas, tanto autistas quantos jogadores, e caso ela se sentisse incomodada com isso conversasse com o time, não saísse insultando assim, não sai trazendo autistas pra conversa, porque isso nem diz respeito, não consigo entender qual é a relação que ela teve para conseguir pensar nisso, eu fico insultado só de ler, então o twitter traz esse tipo de abordagem para pior, é muito comum esse tipo de coisa, só que vindo de uma de uma pessoa com a notoriedade que ela tem é mais insultante, porque ela deveria ter no mínimo a formação profissional para saber que isso não é o que ela deveria fazer.

Tiago: É uma questão de postura, e a postura que ela teve quando ela começou a receber críticas para mim representa a grande maioria de pessoas que usam autismo como piada, como ofensa. O que ela fez, primeiro ela atacou pior ainda, ela revidou de uma forma muito mais desproporcional as críticas que tava recebendo, segundo que ela  não pediu desculpas de maneira alguma, ela ficou dizendo que ela podia falar isso, porque ela vinha de uma família de psiquiatras, ou seja, mais uma vez aquela questão da carteirada médica né, não que eu esteja criticando aqui psiquiatras, neurologistas, profissionais médicos, mas infelizmente tem muita gente que usa o conhecimento acadêmico, conhecimento médico, que adquirem como forma de demonstrar superioridade, então eu posso jogar a verdade na cara das pessoas porque eu tenho a formação, porque eu venho de uma família de médicos. O que ela fez, ela desativou o Twitter, ou seja, a pessoa não dá o braço a torcer, eu tenho impressão que essas pessoas que fazem piadas com autismo e tudo mais, dificilmente pedem desculpa, dificilmente elas falam: Poxa, eu fiz errado; Não, elas reagem, ou dizendo que é mimimi, mimimi que é aquele termo utilizado quando a pessoa não tem argumentos e ela acha o argumento da pessoa inferior e quer menosprezar, ou desativa o twitter achando que simplesmente sumir com seu twitter some com o problema, a situação não aconteceu, o problema é de quem lembra, de quem ficou na memória, porque isso não some da internet, o que ela fez não vai sair da internet, saiu nos portais de notícia, nos portais de esportes, são as discussões das páginas de autismo. Então as pessoas deveriam pensar muito antes, não só em como elas manifestam o seu preconceito em público, mas como elas pensam, é algo muito sério e eu acho que vai demorar para vocês pararem de usar autismo como adjetivo, ainda mais agora que autismo tá na moda.

Luca: Bom, não acho que adianta só a pessoa não usar isso, porque não garante que a pessoa não pensa assim, não garante que eu não tenho preconceito, o ideal seria que a pessoa realmente não ache isso, que a pessoa não veja isso, mas isso só será atingido quando a pessoa tiver contato e tiver informação, muitas vezes nem informação trazem, então para isso que serviria o apoio da justiça para casos assim.

Tiago: Eu só quero fazer uma correção, ela não disse que é de uma família de psiquiatras, ela disse em uma citação publicada pela Sport TV: Não me arrependo de ter falado dessa forma, eu sei que muitos são autistas, minha família é de psicanalistas, acharam que era preconceito mas é verdade. 

Tiago: É complicado. Bom, acho que com isso nós encerramos o episódio, eu agradeço muitíssimo a você ter disponibilizado seu tempo para nos ouvir, para nos julgar caso você ache necessário, e agradeceria qualquer tipo de contato caso você queira falar sobre esse episódio, sobre outros casos em que a gente foi usado com piada, como ofensa, fale desses exemplos, faça seus comentários, críticas, e envie seu e-mail para o ouvinte@introvertendo.com.br.

Luca: Muitíssimo obrigado, e até mais.

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