Introvertendo 26 – Mercado de trabalho

Há quem diga que autistas não conseguem se integrar em sociedade. Os mais ousados vão além e duvidam de uma inserção eficaz de pessoas no espectro no mercado de trabalho. Mas há autistas atuando. Neste episódio, nossos três podcasters discutem suas experiências em diferentes empresas, as dificuldades enfrentadas nos processos seletivos e no dia a dia, e muito mais.

Participam desse episódio Paulo Alarcón, Thaís Mösken e Tiago Abreu. A partir deste episódio, Paulo e Thaís, antigamente somente ouvintes, são membros oficiais do Introvertendo.

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Transcrição do episódio

Tiago: Olá pra você que escuta o podcast Introvertendo desta produção que é feita para pessoas neurodiversas e pessoas também neurotípicas. Meu nome é Tiago Abreu e hoje estou com duas pessoas aqui com participação nova no nosso podcast e eu vou deixar que ele se apresentem.

Thaís: O meu nome é Thaís Mösken, eu tenho 27 anos e hoje em dia eu moro em Florianópolis, apesar de que eu sou de São Paulo. Sobre o meu diagnóstico, talvez algumas pessoas já tenham ouvido que eu eu mandei já alguns emails pro pessoal e tudo mais, mas eu tive o diagnóstico bem tarde, aos vinte e seis anos, não faz muito tempo, foi esse ano mesmo e na verdade eu descobri o que era síndrome de after antes. Lendo a respeito e aí eu fui procurar um psiquiatra. Então, bem ninguém imaginava o que eu tinha, eles achavam que eu era meio esquisita mesmo. 

Paulo: Oi pessoal, meu nome é Paulo Alarcón, eu sou de Caçapava. Eu tive o meu diagnóstico feito há cerca de dois meses. Foi quando eu tive contato com o Introvertendo e desde então tenho acompanhado. Sou analista de sistemas.

Bloco geral de discussão

Tiago: E com vocês hoje vamos falar sobre mercado de trabalho, sobre desafios, sobre experiências e com certeza vai ter muita coisa para ser falada aqui. Então é isso. 

Paulo: Tenho alguma experiência aí com entrevistas, de todos os tipos. Tradicionais, falando com entrevistador. Entrevista por Skype, entrevista em inglês e aquelas malditas dinâmicas de grupo. Se você faz dinâmica de grupo, eu te odeio. 

Thaís: A dinâmica foi feita para os aspergers. Para gente se dar mal. 

Paulo: Começando pela famigerada dinâmica de grupo, em que a gente já toma desvantagem de cara. De em pouco tempo ali, se organizar e formar uma equipe para desenvolver as coisas. Ela é bem chata porque né você tem pouco tempo para conhecer as outras pessoas e mesmo que você faça as coisas e se organize bem. Num grupo quem vai levar vantagem é quem aparece. São os extrovertidos, então meio que a gente se ferra nessa.

Então eu nunca fui contratado por uma empresa que por onde eu passei por dinâmica de grupo. Já nas entrevistas normais, normalmente eu consigo me virar. De uma forma criei alguns macetes para conseguir me dar bem. 

Tiago: Quando era mais novo assim eu carreguei já um certo preconceito. Eu acho que eu chamaria isso de preconceito, sei lá, ódio, não sei o que que é. Aos profissionais de RH. Porque eu conheci muitos profissionais de RH preconceituosos. Eles confundem certos critérios de seleção que envolvem a intenção da empresa atingir atingir seu objetivo. Que é ganhar dinheiro. Carregando isso pra vida pessoal, entendeu? Então, por exemplo, eu conheci um psicólogo de RH que ficava julgando detalhes de comportamento das pessoas o tempo todo, incluindo eu. Era muito “é você está fazendo isso porque você não quer isso” e tudo mais. Eu fui criando uma certa rejeição a esse tipo de profissional. 

Thaís: Os profissionais de RH, na verdade todos os psicólogos, terapeutas, psiquiatras. Eu percebo que tem essa de alguns que são bem compreensivos e tudo mais que realmente eu considero mais preparados para julgar até pra avaliar. Mas muitos deles aparecem com uma série de preconceitos, uma série de metodozinhos antigos e você tem que fazer parte daquele padrãozinho neurotípico. Tem que ser a pessoa feliz, a pessoa que fala, a pessoa que tá dividindo o trabalho com todo mundo. Parece que eles estão procurando um um tipo muito específico e perfeito de profissional que não existe. Então, no final, um monte de gente tá lá fingindo enquanto a gente não é bom em ficar fingindo. Então acaba sempre prejudicando quem não é neurotípico. 

Paulo: É o que me parece. Normalmente isso parece bastante naquelas seleções que são com grande número de pessoas.

Thaís: É verdade. E aí fica uma zona. Não sei se vocês se sentem assim, mas pra mim parece muito bagunçado, além da gente ter pouco tempo e ser difícil dividir às vezes não tem tarefa suficiente pra todo mundo e a gente se sente ou fazendo muita coisa ou não fazendo nada. Se alguém já pegou, sei lá, tem uma tabela numa mesa de dez pessoas, aí uma pessoa pega a tabela antes e você fica olhando assim, e agora que eu faço aqui, né? Então em geral eu prefiro mesmo as entrevistas que não tem grupo. Que facilitam bastante.

Tiago: Engraçado que assim, na minha experiência profissional, o máximo que eu fiz foram às vezes atividades ligadas à universidade. E em um caso específico eu fui a empresa que eu trabalho, eu não fui atrás dela. A empresa que foi atrás de mim. Se não eu acho que eu nunca teria chegado a trabalhar nela, porque digamos assim eu trabalho de forma independente e público na internet na atividade jornalística. Essa empresa acabou tendo acesso a esse conteúdo, leram e eles entraram em contato comigo por e-mail, me chamaram pra conversar no Skype. E aí já a partir de uma pré-conversa direcionada as coisas fluíram muito bem. Foi até um modelo assim muito diferente do que eu esperava e etcétera. Eu tinha pavor só de pensar no momento de chegar nessas partes.

Thaís: Nossa, mas você realmente caiu no tempo certo para você. Porque é muito difícil pra quem tá entrando no mercado, a empresa ir atrás. Nossa, eu ficaria assim muito feliz com uma coisa dessas. 

Tiago: Sim, até hoje eu não acredito muito, ainda mais por se tratar de uma empresa de outro estado, entendeu? Então, por exemplo, este ano eu fui para Porto Alegre. Para conhecer a cidade e o ambiente. Justamente por essa série de questões, mas é mas aqui também nessa área de tecnologia principalmente eu percebo que é uma carência muito grande de profissionais ultra especializados em um “parafuso”. E aí às vezes a empresa precisa buscar a gente lá na na casa do caixa-prego, para poder cobrir aquela demanda. 

Thaís: Aí a gente estava falando sobre os processos seletivos, né? A gente acaba comentando mais a dinâmica que é realmente acho que é o problema maior pra maior parte dos asperger. Mas tem também outras coisas que me deixam com muita raiva. Em geral, o que eu me dou bem são aqueles testes. Eles às vezes tem teste de lógica tal, eu fico muito feliz quando tem esse tipo de coisa. Mas uma coisa que me deixa com muita raiva é quando tem uns testezinhos bem e pré-concebidos de ideias meio estranhas pra mim. Por exemplo, às vezes pedem para desenhar uma árvore, não sei se já aconteceu aí com o Paulo. Mas a minha mãe já tinha me falado que ela desenhou essa árvore. Ainda bem que ela me falou, porque na hora que me deram pra desenhar a árvore eu já tinha noção do que era pra eu fazer. A ideia é assim se você desenha uma árvore é sem sem fruta sem folha sem nada é como se você não fosse dar frutos no trabalho e aí a ideia é foi a ideia é você desenhar uma árvore bonita, frondosa e com frutas, mas não pode colocar carinha, porque carinha indicaria infantilidade. Não pode colocar aquela bolinha assim indicando tipo um buraquinho no meio porque aqui eu indica que o negócio é ruim. Você tem que colocar o chão porque  indica que você não é uma pessoa pé no chão, sabe? Você é adulado. Umas coisas bem bizarras que eu acho que não fazem o menor sentido e que eu levei eu desenhei de acordo com o que minha mãe falou que era esperado. Então é um outro teste que não mostra nada e uma pessoa que sabe desenhar muito bem, que quer fazer uma árvore estilizada, ela não vai seguir esse padrão. Então mas tem esse tipo de teste também. 

Tiago: Ou para uma pessoa que desenha que desenha uma árvore seca para representar um momento transitório de sei lá depressão. Né? Significa que essa pessoa não vai produzir pra empresa não vai separar a vida pessoal dela profissional porque tem gente que que é assim que tem duas vidas né digamos assim. 

Thaís: É aparentemente na cabeça de quem inventou esse teste e é exatamente isso. Uma pessoa que desenha uma árvore seca não vai produzir nunca. Não importa o momento da vida dela. 

Paulo: É bem estranha e bem preconceituosa né? 

Thaís: Então eu acho que a gente acaba tendo que se preparar pros testes. Descobrindo esses detalhes, essas minúcias, que são coisas que pra mim não são nem um pouco prazerosas. Quando eu entrei nessa empresa para fazer a entrevista e me pediram pra fazer essa árvore, eu já duvidei de todo o processo seletivo. Eu já duvidei da empresa, eu já achei que aquilo parecia tudo muito idiota. Então, eu já fiquei com uma impressão negativa. Isso que eu precisava de uma vaga para estágio. Então se eles me chamassem eu teria aceitado. Mas no final outra empresa me chamou antes, ainda bem. Ainda assim, eu lembro que eu pensei assim no primeiro dia, “ah eu só viria pra cá por não ter opção”. 

Paulo: Eu tive um pouco de sorte que eu nunca passei por um teste desse, Mas assim, a maior parte dos testes que eu passei nas empresas eram testes bem ligados a minha da área de tecnologia então era mais mais os conceitos que a gente tinha que aplicar mesmo e fazer um teste de lógica e teste de inglês também que pegava bastante. 

Thaís: Eu acho que eu não falei né que eu fiz engenharia civil. Então teoricamente daria pra ter um teste mais técnico pra mim também, né? 

Tiago: E você trabalha na área de engenharia? 

Thaís: O meu estágio foi na engenharia, mas eu acabei saindo. Por uma série de motivos, incluindo a crise, eu estava com dificuldade mesmo de encontrar emprego na engenharia civil. Eu comecei a fazer alguns cursos EAD mesmo vocês podem pós-graduação EAD em gestão ambiental e depois eu comecei um técnico EAD também no Senac em técnicos de meio ambiente. Ainda tô fazendo esse esse técnico porque eu acho interessante e tudo, mas no final, hoje em dia eu trabalho como analista de dados. A minha trajetória foi bem bizarra. 

Tiago: E só por curiosidade, quais aspectos da engenharia civil você consegue utilizar na como analista de dados? 

Thaís: Na verdade não seria o que eu estudei na engenharia em si apesar de que assim se for pensar eu tive lá a disciplina de estatística que eu acabo usando.  Mas creio que seria mais o conceito geral de lógica. Na verdade eu fiz engenharia civil o que eu queria mesmo era fazer astronomia na época porque eu participava da olimpíada de astronomia. Só que eu considerava assim “ah eu nunca vou encontrar emprego para trabalhar em astronomia aqui no Brasil que eu vou seguir a vida”, não sei o que então eu decidi cursar engenharia só pensando no mercado de trabalho e me arrependi muito. Foi muito difícil me formar. O meu curso deveria durar cinco anos, durou oito e eu fui arrastando assim aquele curso, mesmo detestando. Fazendo um monte de matéria, um monte de coisa por obrigação. Quem é asperger sabe como é difícil a gente tentar e se concentrar no negócio que a gente detesta. Eu estava muito longe do meu hiperfoco da época, na astronomia. Nossa eu podia estudar o dia inteiro aquilo, na época da Olimpíada. Podia estudar o dia inteiro que eu estava feliz, não tinha problema. Agora na engenharia, tudo me dava raiva ali. Mas me formei de qualquer forma. Foi aquela coisa assim agora eu tenho um diploma então o que que eu vou fazer da vida. 

Paulo: A minha trajetória foi menos dramática do que essa. Eu na verdade me formei em tecnologia automação industrial e robótica. Só que comecei a trabalhar na área de robótica e foi muito difícil conseguir emprego, tanto é que a única experiência que eu tive nessa área foi bolsa de pesquisa. E aí eu fui migrando para a área de TI. Já que eu já tinha aprendido a programar, tinha pegado gosto por programação na faculdade. Para mim foi mais fácil migrar para área de análise de sistemas. 

Thaís: Uma coisa que você falou agora de TI que o Tiago perguntou é a relação entre engenharia e análise de dados. No final, a ferramenta que como engenheiro eu mais usei praticamente foi o Excel. Se você vai pensar, na análise de dados grande parte a gente acaba fazendo no Excel, no caso da empresa que eu trabalho hoje a gente usa Google Sheets. Mas é a mesma coisa praticamente. Então é justamente a ideia de você pegar números e entender o que eles querem dizer de verdade, não tirar conclusões bizarras dele, tirar conclusões que façam sentido com a realidade e tomar decisões com base em números, né? Então, pra mim isso é mais esse caminho. No meu emprego atual, o primeiro teste que eu fiz quando eu me candidatei, ele era um teste muito completo, na verdade era uma bateria de testes diferentes que eles serviam para dar o seu perfil. O teste apresenta uma média, as pessoas seriam por volta de setenta por cento em cada uma das características. E ele divide em características conforme você vai fazendo o teste a sua pontuação vai se alterando. Capacidade analítica, flexibilidade, tomada de riscos, assertividade, iniciativa, ambição, estabilidade emocional, facilitação, sociabilidade, influência, consideração pelos outros, comunicação, planejamento e organização, pensamento criativo, reflexivo e pensamento conceitual. Então, o teste te dá uma pontuação para cada um desses atributos e ele explica. A devolutiva do teste é super completa, ele explica o que é cada um desses atributos. Eu achei muito interessante que o meu foi bem esperado de asperger, né? A parte mais social está abaixo da média, não extremamente abaixo, mas está baixa e a parte analítica está muito acima. Então foi muito bom na hora que eu entreguei esse teste e eu acabei dando sorte que eles estavam justamente procurando uma pessoa de perfil analítico e isso num num é tão comum assim, né? Mas pra mim uma empresa que tem um teste completo como esse já me passa uma confiança maior de que eles sabem o que eles tão fazendo, eles sabem quem eles estão contratando e para que eles tão contratando. 

Paulo: Uma coisa que vale a pena adicionar também na questão de preparação para entrevistas de emprego, é pesquisar em sites como o Glassdoor e o Love Monday. Em que você consegue ver as informações que os outros usuários que passaram para entrevista numa numa empresa que você pesquisava falam sobre a entrevista né? Até falam sobre o tipo de teste que entra normalmente, quais são as perguntas mais comuns. 

Thaís: É verdade é essa questão eu eu tinha eu na época do meu estágio muita gente falava “ah tem que pesquisar sobre empresa antes de ir lá” e tudo mais. Só que no estágio às vezes a gente está se candidatando pra sei lá, cinquenta empresas diferentes. Não dá pra gente ficar pesquisando sobre cada uma delas. Mas eu senti que nessas entrevistas do meu emprego atual eu tento pesquisar mesmo sobre empresas, era uma área que eu não tinha a menor ideia sobre; A empresa trabalha com marketing. Eu nem sabia que existia a vaga que eu trabalho hoje. Eu ter pesquisado mesmo sobre a empresa antes ajudou muito. Só que isso é quando você está focado em um trabalho específico.

Tiago:  Além dos processos seletivos, eu acho que um grande calcanhar digamos assim, nosso. É exatamente a maior parte do que vai acontecer a maior parte do tempo que é trabalhar é o espaço e principalmente um fator chamado pessoas.

Paulo: Onde eu trabalho a gente ainda existe uma política que até bem chata pra mim que eles assumem que eu nem todos os lugares vão estar sendo sempre utilizados, porque sempre vai ter alguém de férias, alguém trabalhando de casa ou de outra cidade, na matriz em São Paulo. Então eles incentivam o pessoal a ficar trocando de lugar. Mas eu por exemplo gosto muito de ficar no meu cantinho lá que é onde eu consigo me focar no meu trabalho. Mas de resto, quando você tem um um time ali de pessoas, que é como a gente trabalha mesmo, em times. São cinco pessoas no time que fica focado pelo menos um ano juntos. Acaba sendo algo de menos. Já que não tem tanta variação das pessoas, você conhece as pessoas e consegue pegar confiança. Também é outra coisa que, pelo menos pra mim, me ajuda. É ter claro quais são as minhas funções lá. Saber exatamente o que eu tenho que fazer no time, mas imagino que seja ruim trabalhar com mudança frequente de time. Isso aconteceu comigo uma vez, eu fui emprestado pra um pra um time de uma de uma outra área, que pra cobrir a saída de outra pessoa, E nesse período eu fiquei bem perdido ali. Pois eu estava acostumado com uma forma de trabalho e tive que mudar totalmente durante um mês com eles. 

Thaís: Bom, eu senti uma diferença muito grande assim na época do meu estágio. Eu ainda não sabia que eu era asperger. Então tinha pessoas de que eu gostava, com quem eu trabalhava bem. E pessoas com quem eu trabalhava muito mal. Tinha algumas coisas que eu não compreendi porque eram de um jeito. E acabei com o tempo aceitando que as vezes a gente tem que fazer algo de um jeito. Mas até hoje eu ainda viro professor e falo “ó eu sei que eu tenho que fazer do jeito que você ta dizendo, mas eu discordo”. Então naquela época eu não tinha o costume. Foi o meu primeiro emprego, vamos dizer assim, estágio. E eu nunca fui muito boa em aceitar essa questão de hierarquia, pela hierarquia. Eu respeito as pessoas pelo que ela sabe. Mas não simplesmente achar que uma pessoa por estar numa posição superior pode qualquer coisa. Mas muita gente tinha esse tipo de visão, né? A minha dificuldade com as pessoas, eu acho que era até mais naquele momento social. Porque infelizmente o trabalho infelizmente, mas talvez felizmente também. O trabalho não é só trabalho, né? Então tem aquele momento do cafezinho que é esperado, que você participe e aí começa aquele monte de conversa que, não só às vezes eu não conseguia acompanhar muito bem. Mas principalmente eu não tinha interesse na maior parte dos assuntos que o pessoal estava falando. Acabava que eu tentava me forçar a fazer a minha parte social, porque sempre eu tinha que fazer. Então eu considerava como uma obrigação minha. Hoje nessa empresa que eu trabalho na hora de de preencher o currículo, na hora do “cadastra aqui o seu currículo”. Já me cadastrei como asperger, porque eu já tinha diagnóstico oficial e tudo mais. Então, quando eu cheguei lá, a minha sensação foi completamente diferente. Porque o meu time já estava preparado pra receber uma pessoa asperger. Acho que uma semana antes, se não me engano, foi lá uma psicóloga explicar pra eles o que era autismo e de forma geral, o que era asperger mesmo que tenha variações grandes entre uma pessoa e outra e tudo mais, né? Eu sou a segunda asperger da empresa, então a empresa hoje tem umas setecentas pessoas e somos só duas até onde a gente sabe. De qualquer forma eles já saberem facilitou muita coisa. Porque na hora que eu cheguei lá o meu gestor já virou e perguntou pra mim “Ah, o que eu tenho que fazer diferente, você vai me falando, me dá o feedback aí”. Eu já falei pra ele que eu também preciso de feedback para entender se eu fiz alguma coisa certa, alguma coisa errada. E uma coisa que eu acho muito importante e que foi uma das primeiras coisas que eu falei pro meu time é a questão do “é sério”. Muitas vezes acontece das pessoas estarem brincando, né? Falando alguma coisa de brincadeira e rindo. Aconteceu isso com a minha chefe da época do estágio, ela era muito brincalhona e ela me pediu pra rindo para fazer uma coisa que eu achei uma coisa tão absurda. Eu achei que era brincadeira e eu não fiz. E era sério. Então eu virei pro meu gestor e falei então “você pode brincar o tanto que você quiser e tudo mais. Às vezes eu vou entender. Às vezes não. Mas no momento que eu pergunto se aquilo é sério considera essa frase muito importante”. Nunca diga que é sério ou que não é porque senão eu vou começar a fazer coisas erradas. Então ter já essa noção do grupo todo já saber o que esperar ou pelo menos saber que eu não entendo as coisas da mesma forma que eles já facilitam muito. Me dá tranquilidade para trabalhar e faz com que eu tenha mais vontade de trabalhar. 

Paulo: E com relação a parte da parte mais social eu sou bem sociável com o pessoal que faz parte do meu grupinho ali do meu do meu time. Eu não gosto de eventos da empresa. Tipo festa de de final de ano, de happy hour. Isso eu já não curto. Mas quando se chama o time todo para tomar um café, isso eu já acho legal.  Fazer um almoço especial. E até por trabalhar na área de TI, onde se tem uma grande concentração de pessoas estranhas por metro quadrado. Se cria certos padrões para quando se fala sério e quando é brincadeira. Também tive esse problema de quem fala brincando, mas é sério. Um cara que não é exatamente do meu time, é quem passa as demandas para gente. Ele veio de brincadeira de fazer hora extra. E eu e o pessoal pensamos que era brincadeira mesmo, se fosse para gente fazer hora extra ele falaria mais sério sobre isso. No final ele falou para o superior dele, mas como nosso time todo estava alinhado todos concordaram que ele falou do jeito errado.

Thaís: Não foi só você, no caso.

Paulo: Não foi só eu que percebi isso. Fora que ele falou isso do nada. Tinha gente que tinha médico, que precisava sair no horário certo, então o cara chega falando assim do nada não não é legal. 

Tiago: Quando eu era aprendiz nos correios. Pelo fato de ser uma empresa grande ,ela tinha uma estrutura que era interessante. No sentido de que aprendi. Não era muito forçado a fazer certas coisas mas eu tinha por exemplo pavor de adesivo, odiava. 

Thaís: Nossa, uma época no meu estágio me colocaram pra fazer cotação. Eu tinha uma lista de produtos de engenharia civil, então tinha um projeto sei lá tantos metros e tubo de tal tipo tinha que ficar ligando pras empresas e era a coisa que eu mais odiava até porque era um bico sabe? Eu estava envolvida em um projeto, mas às vezes precisavam dessas cotações em outro e falavam “ah pega estagiária”, né? Então eu ia lá nossa eu se eu sou sabia que eu tinha que fazer aquilo naquele dia, o dia já começava ruim. Eu já ia contando as horas pra sair, pra ir embora. Já nos dias que eu ia fazer um projeto mesmo, participar das outras atividades, eu chegava animada, não via a hora passar, era bem diferente. Então, telefone para mim é outra coisa que é terrível. 

Tiago: Quando eu fazia projeto de extensão na universidade já na área do jornalismo e tinha que apresentar programa, fazer entrevista ao vivo, eu pulava fora. Arrumava alguma desculpa ou algo do tipo. Porque eu gosto de entrevistas pessoalmente, eu gosto de entrevistar até por e-mail, que não é adequado. E eu não acho que é um método bom, mas qualquer coisa menos telefone. Porque eu acho o telefone e tem muitos ruídos e você fica obrigado a dar aquele senso de resposta imediata. E agora que eu que eu trabalho nessa empresa atual, por enquanto via home office e é muito legal porque eu tenho uma independência de atividade. Então eu consigo fazer as coisas no meu tempo e às vezes consigo fazer numa velocidade muito boa sem afetar a produtividade. E aí a minha experiência no ambiente da empresa, que que não foi muito grande. É um ambiente compartilhado, digamos assim. Você tem as várias mesas de escritório e os grupos ficam divididos ali, todo mundo compartilha o mesmo ambiente. De certa forma vários segmentos como não é uma empresa muito grande e eles conversam entre si com uma facilidade grande. E a minha adesão foi muito boa. O que me surpreendeu. Então por enquanto eu nunca precisei falar do diagnóstico. Aí eu eu queria perguntar pro Paulo especificamente se o pessoal da empresa dele sabe. 

Paulo: Não, eu não comentei do meu diagnóstico pro pessoal da minha empresa por N razões. Fico até com um pouco de receio de um pessoal começar a me tratar diferente por conta do diagnóstico, né? Começar a pisar em ovos pra falar comigo enquanto continuo sendo a mesma pessoa. E outra coisa também, é que a empresa veste o chapéu de ser inclusiva e eu posso acabar virando garoto propaganda lá. 

Thaís: A minha empresa também se considera bem inclusiva. Eu acho que é uma empresa bem inclusiva em vários aspectos, né? Acho engraçado na empresa pra quem me conhece sabe que eu sou mas eu não divulguei pra maior parte dos meus conhecidos, então colegas de faculdade por exemplo tem uma pessoa na faculdade que sabe e só. Mas tem muito mais gente na empresa do que fora dela e realmente a gente tem esse receio assim de um preconceito e tudo mais. Mas o que eu senti lá, pelo menos. São as pessoas querendo entender mesmo que é asperger, as pessoas chegam com curiosidade e eu acho legal explicar ou pelo menos tentar, né? Explicar o meu ponto de vista sobre aquilo. Então, eu não sinto esse preconceito lá dentro. Felizmente, isso não tem acontecido e em geral as pessoas são compreensivas também no sentido de se eu precisar “ ah, está tendo muito barulho”.

Um exemplo que aconteceu há pouco tempo, como eu trabalho com análise de dados de vendas, eu trabalhava no mesmo andar do pessoal de vendas. E quando alguém fecha uma venda, no caso era o que chamavam de oportunidade, fica aquelas gritaria todo mundo comemora e o gongo ficava do meu lado. Então as pessoas e eu às vezes tocavam o gongo porque estavam felizes e tal e eu não sabia o que fazer. Porque era horrível pra mim. Eu me sentia badalando assim. Meu corpo inteiro badalando. E eu ficava um tempo sem conseguir fazer nada. Cada vez que tocava aquele gongo. Mas eu também não queria tirar a animação das pessoas, elas estavam tão felizes porque conseguiram vender, conseguiram fazer algo que vai ser bom pra empresa, né? E num eu não queria me sentir atrapalhando, mas no final eu acabei indo falar com meu gestor, falei, “ah, eu não sei o que dá pra fazer e tal, sobre esse gongo”, ele falou, “ah, eu vou colocar do outro lado”. E no dia seguinte estava resolvido. O gongo estava do outro lado do andar e não me incomodava mais. Então às vezes a gente pensa que vai ser complicado resolver alguma coisa e acaba sofrendo e aceitando aquilo achando que a gente tem que aguentar. Enquanto cada dia vai se tornando pior, vai se tornando mais irritante e às vezes a solução é muito simples.

A gente que não tá percebendo a simplicidade dela pras pessoas, a gente fica também pisando em ovos, né? Por nossa vez. Então pra mim isso foi muito bom. E outro dia também conversando com a outra menina asperger lá da minha empresa. Ela estava me contando que de vez em quando tem o que a gente chama de Team Building. Vai ter na semana que vem meu primeiro, nunca fiz com essa empresa. Às vezes aparece os psicólogos com umas ideias muito loucas que mandam o pessoal fazer umas atividades sei lá, vamos pra praia e vamos fazer castelinho de areia. E aí eu já cheguei, já conversei com meu gestor e falei, “olha, cê me pedirem pra fazer alguma coisa, uma atividade que eu me sinta mal, eu já quero uma permissão prévia pra não fazer”. E aí ele já deu OK, então eu também já não me sinto mais tão tensa em chegar na terça-feira e ir lá ver o que que vai acontecer, porque antes eu já estava prevendo o pior, já tava ficando ansiosa achando que ia ser terrível. Então, tem muita coisa que a gente resolve de um jeito simples, simplesmente por eles saberem que a gente é um pouco diferente nisso. 

Paulo: Eu já passei por uma experiência de Team Building há um tempo atrás. Não foi uma experiência ruim, até foi bem interessante. A gente fez um teste de personalidade naquele teste das dezesseis personalidades, não sei se vocês conhecem? 

Tiago: INTJ, tipo isso?

Paulo: Exatamente, esse mesmo. E depois a gente assistiu um vídeo e fizemos uma dinâmica rápida, simples. De que envolvia mostrar as coisas que são importantes para cada um. Então tipo dá um monte de papeizinhos com pontos e guarda. Tipo, excelência na empresa, posição na empresa essas coisas e aí a gente organizava numa escala de o que era mais importante pra gente e o que que era menos importante. Foi um pouco interessante, não foi algo assim muito viajado, não fiz tudo na minha. Meu tipo de personalidade é o INTJ. 

Thaís: Eu acho que eu fiz e agora que ele falou introvertido, intuitivo, eu acho que eu já fiz esse teste na internet. Mas naquela coisa de fazer de feliz mesmo. Talvez em algum teste do Vagas, não sei, mas na empresa eu nunca fiz. O meu o meu maior receio assim nessa questão de Team Building é que como o meu time de análise é muito pequeno, o nosso Team Building é com o time de vendas inteiro são setenta pessoas muito extrovertidas.

Paulo: Nossa.

Thaís: Muito animadas e geralmente ambiciosas né? Porque a gente vem pra ser vendedor, tem que ter uma ambição, então é quase que o oposto de mim. Então, é uma multidão que é o oposto de mim e que provavelmente vai tá animada, gritando, batendo nas coisas assim pra esbanjar felicidade e eu vou ficar completamente louca. Era o que eu estava pensando. 

Tiago: E quando vai tocar a música do Chiclete com Banana?

Thaís: Nossa, eu não duvido de nada.

Paulo: No caso o que eu participei foi pequeno mesmo. Eu fui com cinco pessoas, então eu fui num período curto de tempo, de uma manhã. Então pra mim foi de boa. Talvez o seu vá ter alguma coisa diferente aí.

Thaís: Eu vou descobrir.

Paulo: Achei grande, é.

Tiago: Uma coisa muito presente nisso tudo que nós falamos é sempre uma oposição digamos assim ao que é extrovertido, introvertido e que tanto a estrutura do RH quanto às relações sociais dentro da empresa. Elas valorizam esse perfil mais extrovertido. E aí uma uma questão é como se destacar nesse espaço, como ganhar o seu caminho e não ficar mudando muito de empresa?

Paulo: Da minha parte eu que eu tenho usado para destacar, o que eu diria que é o ponto forte do Asperger. Que é o hiperfoco. Eu tento me destacar pela excelência no trabalho com com um trabalho numa área ali que valoriza bastante a inovação, Acaba que para mim é até um pouco fácil conseguir algum destaque. O problema é que é fato, né? O problema é que quem evolui mais rápido na carreira são as pessoas que assumem a liderança, que normalmente são extrovertidas. E nisso até eu vejo que minha evolução é mais devagar do que a de outras pessoas. Mas esse ano, o meu diagnóstico foi decorrente disso. Que eu estava procurando formas de me entender e como conseguir me destacar em meio as outras pessoas e eu só estou até acompanhando um livro que eu que eu indico que é O Poder dos Quietos. Que fala sobre como pessoas introvertidas e tímidas em geral conseguem assumir posições de liderança e liderar equipes. E tem algumas coisas bem interessantes sobre isso. Que é a ideia de quem é liderado por pessoas que tem essa característica de introversão. Eles são ele tende a ser mais manipuladores no sentido de que cara tendência é a gente deixar as pessoas mais livres, né? E falar pouco. E falar o necessário. 

Thaís: É, no meu caso eu acho que eu uso muito a parte reflexiva. No que você perguntou sobre mudar de empresa, no caso eu nunca mudei de empresa, eu tive o meu estágio e tenho esse emprego hoje Mas eu acho que eu uso muito mais a minha parte reflexiva assim para planejar o que pode dar errado. Inclusive porque o meu gestor, por exemplo, é uma pessoa muito otimista, sabe? Então pra mim o mais importante sempre foi manter o pé no chão e ter sempre um plano B. “Se algo der errado, o que que eu faço? E se aquilo der errado? Ah, então eu faço isso”. E como eu sempre fui muito reflexiva, sempre passei muito tempo pensando a respeito das coisas, para mim isso é natural. Eu não preciso parar pra pensar que eu tenho que criar um planejamento. Eu simplesmente planejo. É natural pra mim, talvez outros aspergers também sejam. Já que a gente tem aquela questão de ficar pensando como as coisas serão para não ter muitas surpresas, né? Pelo menos muitos de nós. Então pra mim isso é natural e não é pros neurotípicos, foi uma coisa que eu só descobri depois. Eu achava que todo mundo era assim e eu acho que isso é uma força que a gente tem e que a gente pode usar a nosso favor. Sempre ter essa carta na manga assim, ter o plano B. Salvar alguma coisa que está dando errado, está cada vez pior. E aí você aparece com alguma coisa. “Não é isso, faz tal coisa”. Então a minha principal sugestão tá tá nesse ponto.

E também como o Paulo falou tem a questão da excelência eu acho que a gente muitas vezes é persistente em algo que tá fazendo. Então não importa se a gente tiver que ficar um tempão olhando até encontrar o erro, a gente vai ficar ali. E em geral eu percebo principalmente nas sextas-feiras que as pessoas chegam na sexta-feira já querendo ir embora e em geral. Nossa, tantas vezes eu falei em geral hoje, que horrível. Mas normalmente eu não sinto isso nos meus colegas asperger, tanto a menina que trabalha comigo quanto os outros que eu já conheci. A gente tá lá pra fazer nosso trabalho e na hora que a gente vai embora a gente vai. Mas a gente vai terminar de fazer o trabalho, não é porque sexta-feira que é hora de beber, é hora de sair e tudo mais. Então a gente costuma ter muito mais disciplina em algumas coisas. A gente pode parecer indisciplinado em algumas coisas, como por exemplo nessa questão de receber ordens, nem todos nós somos bons nisso. Mas nós costumamos ser muito mais disciplinados do que as outras pessoas. Isso também é um ponto de destaque. Nem sempre isso é valorizado, em relação a promoções, mas isso faz com que o nosso trabalho atinja uma certa excelência.

Paulo: E às vezes conseguir encontrar formas de mostrar os resultados, isso acaba abrindo portas também. No caso eu passei por algumas mudanças de empresas. Até porque na área do TI é muito comum que as empresas só deem promoção pra alguém quando aparece com uma com a proposta de outra empresa. E comigo tive que fazer isso né só que como eu estava sempre atualizando o LinkedIn e colocando as coisas que eu ia conquistando chegou um ponto em que começou a vir recrutadores atrás de mim. E eu chego a rejeitar propostas porque não compensa, vou ter que mudar pra muito longe ou.

Thaís: Nossa, é o sonho de muita gente poder rejeitar as propostas assim. Eu sei a felicidade que eu senti em poder rejeitar a proposta daquela empresa da árvore. Isso ainda no estágio.

Tiago: Eu achei interessante o que vocês falaram sobre a questão das ordens. Eu sou o tipo de pessoa que eu não consigo funcionar muito bem no trabalho se eu não tiver independência. Já que eu trabalho muitas vezes com parte criativa, né, jornalismo e etc. Geralmente eu consigo conquistar minha independência, em questão de atividades. Mas se a redoma fechar muito, eu pulo fora. E isso me trouxe muitos problemas entre 2015 e 2016, pois eu entrava em muitas atividades diferentes em diferentes empresas e trabalhos on-line. E não conseguia ficar nem um ano exercendo o mesmo tipo de trabalho. E isto só mudou com este último emprego. Com maior estabilidade e estrutura. 

Thaís: Eu acho que a gente tem que ter em mente também, que quando a gente entra na empresa. Tem aquele período em que estamos sentido o que está acontecendo ali, como as coisas funcionam. A gente vai vendo isso no dia a dia e cada empresa é diferente. E muitas vezes nessa parte inicial de aprendizado a gente não vai ter muita independência. Já que a gente não sabe bem o que fazer ainda. Nessa minha empresa atual, eu entrei em um período um pouco conturbado. A gente estava mudando de banco de dados, a implementação ainda vai ser na semana que vem. E o meu gestor estava ocupado demais para sentar para me explicar a maior parte das coisas. Ele até acabou pedindo para alguns estagiários me explicarem grande parte. E eles foram super gente boa nesse aspecto.

Mas chegou um ponto em que eu estava desmotivada pois não sabia o que deveria fazer. Eu recebia uma demanda, completava e aguardava pela próxima. E às vezes me sentia muito improdutiva. Então um dia eu virei para ele e disse “Então, o que realmente é esperado de mim? O que eu preciso fazer.” e tudo mais.  Então a partir daí ele me explicou o que eu poderia fazer e eu pude agir de forma mais autônoma. “Ah, você pode ir atrás de projetos para melhorar tal área“. Eu pude tocar aquilo sem precisar ficar esperando novas ordens. E isso para mim foi excelente. Mas eu não funciono bem se uma pessoa me dá uma ordem sem muitas explicações. Se ela falar “Isso é sigiloso e depois eu vou te contar”, tudo bem, eu consigo trabalhar assim. Mas a pessoa aparece assim com uma ordem do nada pois ela quer que eu faça. Isso não dá certo. Felizmente isso não aconteceu por aqui e espero que não aconteça; 

Paulo: Dá minha parte. Eu trabalhava numa empresa que era terceirizada de outra empresa. Então tínhamos muito pouco espaço para implementar novidades. E eu sou uma pessoa meio acadêmica, eu gosto de trazer coisas que vejo em artigos e transformá-las num software que pode ajudar no trabalho. E chegou num momento em que estava tudo padronizado demais. Era uma fábrica de software, a demanda chegava, a gente implementava e acabou. Do jeito que a outra empresa pedia. E este foi o momento em que eu já não estava mais feliz nem me dedicando da mesma forma.

Então eu entrei nessa outra empresa que até por ser um time que era novo. Na época conseguimos muita liberdade para trabalhar. Apesar que agora está tendo umas demandas que são mais fechadas e sem espaços para opinião. Eu ainda tenho tempo para dedicar a outros projetos mais livres quando termino algo antes do prazo. Otimizando nossos processos para melhorar nossas vendas no futuro. Então é uma coisa que me motiva a me manter no trabalho e ter essa liberdade para fazer algumas coisas que eu gosto. 

Thaís: Essa questão da autonomia é um motivador muito grande. E eu acho que dentro do possível, se o chefe é uma pessoa acessível, é bom ser claro sobre isso com ele. Eu percebo isso nessa dinâmica que temos atualmente, com pessoas sendo claras e diretas. Eu chego no gestor e falo “Olha, quando eu trabalho de tal forma, eu tenho uma performance muito melhor”. Muitas vezes ele vai entender. Claro que se seu gestor for um cara fechadão ai não vai. Outra coisa que eu estava me lembrando agora, é a questão dos desafios. Eu não sei com vocês, mas eu sempre fui uma pessoa que você falar “ah, eu duvido que você faça tal coisa”, a primeira coisa que eu penso em relação aos neurotípicos é “eu vou provar que faço”. E para mim mesma a primeira coisa que eu penso é “essa pessoa é idiota”. Então eu nem dou seguimento a essas coisas.

Se alguém me desafia, isso não vai levar a nada. E eu percebo que para mim os motivadores são muito diferentes do que são para as outras pessoas. Para as pessoas em geral a competição é muito interessante. Mas para mim não. Eu to fazendo o meu ali e pronto. Então a gente descobrir nossos motivadores e a partir do momento em que a gente descobrir, tentar usá-los a nosso favor. Me ajuda bastante.

Paulo: Você pode usar os motivadores como uma bússola para se seu trabalho bom ou se está na hora de uma mudança. 

Thaís: Verdade, é uma bússola para você ver se você vai continuar feliz. Porque talvez você esteja infeliz em um momento. Mas a culpa não é do trabalho em si. As vezes é só um momento mesmo, são fases. 

Paulo: Inclusive no caso do chefe muito fechado, que você me falou. Esse seria um dos motivos para eu procurar outro emprego.

Thiago: E foi esse exatamente um dos motivos que me fez sair de uma atividade home office que eu exercia. Eu tinha autonomia no início mas depois questões incluindo até o pensamento do chefe interferiam diretamente no que eu estava produzindo. Praticamente a invasão de um espaço que para mim era inegociável. Apesar que a princípio eu negociei. Mas na primeira alternativa, em que eu poderia sair. Eu fui e falei que não queria daquela forma. E ele recuou. Mas daí uma semana depois eu recebi a proposta de onde eu estou trabalhando agora. 

Thaís: Que bom.

Paulo: Que bom.

Thaís: Isso me lembra que no estágio, minha chefe oficial era alguém com quem eu não conseguiria trabalhar bem. Felizmente ela ficou comigo por muito pouco tempo. Era uma pessoa bem fechada. Tanto em termos de horários quanto em termos de tarefas. Mas no final ela ficou de licença maternidade e eu acabei indo trabalhar sob a gestão de outra pessoa de forma não oficial. E com essa outra pessoa eu trabalhei muito bem. Eu sinto que se eu tivesse ficado com a chefe oficial, eu não teria completado os dois anos máximos do estágio. 

Paulo: É uma coisa que eu sinto que foi difícil para mim foi a mudança. Mas hoje eu vejo que se você não se sente bem com uma pessoa, não é problema nenhum pensar em uma mudança nesse momento. Sempre tem alguma empresa melhor.

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Equipe Introvertendo Escrito por: