Introvertendo 205 – Autistas no Cabeleireiro

Autistas e salão de cabeleireiros é uma relação que geralmente não dá certo. Muitos autistas evitam até cortar o cabelo para não passar por situações desagradáveis. Estímulos sensoriais, texturas de cremes e substâncias, barulhos de ferramentas de corte e até conversas entre clientes podem complicar bastante a vida de pessoas no espectro nesses locais. Por isso, nossos podcasters contam as peripécias que viveram na infância e na vida adulta em salões de cabeleireiro.  Participam: Michael Ulian, Otavio Crosara, Paulo Alarcón e Thaís Mösken. Arte: Vin Lima.

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Transcrição do episódio

Thaís: Um olá pra você que é o ouvinte do Introvertendo, esse podcast feito por autistas pra toda a comunidade. Meu nome é Thaís Mösken, eu sou autista, hoje trabalho como administradora de sistemas, tenho 30 anos e fui diagnosticada em 2018. E hoje eu vou ser host desse episódio que a gente vai falar sobre autistas no cabeleireiro.

Otávio: Eu sou o Otávio Augusto. Fui diagnosticado em 2018 e eu queria ter alopecia areata, porque eu amo ficar careca.

Michael: (Risos)

Paulo: Olá pessoal, eu sou Paulo Alarcón, diagnosticado em 2018 e eu sou o caso oposto do Otávio e eu prefiro permanecer cabeludo.

Michael: E eu sou o Michael, o Gaivota, e eu aqui declaro guerra a todos os cabeleireiros, barbeiros, hairstylers, e o que mais tiver que mexa com o cabelo, porque puta que pariu, que negócio chato do caralho.

Thaís: O Introvertendo é um podcast feito por autistas com produção da Superplayer & Co.

Bloco geral de discussão

Thaís: Cada um tem aqui uma opinião em relação a como gosta de deixar o próprio cabelo, mas o que eu queria começar discutindo com vocês, sabendo a opinião de vocês, são as questões sensoriais na hora de cortar o cabelo. Então, independentemente de você preferir manter o seu cabelo comprido ou não, normalmente você precisa cortá-lo em algum momento. Então, o que vocês acham, nesse sentido, vocês têm uns problemas específicos em relação a questões sensoriais?

Otávio: Sensoriais não. É mais uma questão de utilidade pra mim, sabe? Eu gosto de cabelo curto porque sinto muito calor.

Thaís: Mas em relação a experiência no cabeleireiro especificamente, na hora de cortar o cabelo aqueles fiozinhos caindo em você. O que colocam em cima de você, tem alguma dessas coisas que te incomodam muito especificamente?

Otávio: Eu não tenho problema nessa questão de produtos, questão do cabelo. Eu tenho um barbeador preferido, certo? Uma barbearia preferida. E lá os caras fazem um corte quase artesanal. Ele usou inclusive uns produtos bem fortes, eles usam a máquina que fica vibrando na sua cara, eles colocam toalha quente, não incomoda muito não, viu?

Paulo: Eu tenho sensações mistas com o ato de cortar o cabelo de barbearia. Tem coisas que eu gosto e tem coisas que eu detesto. Uma coisa, por exemplo, que eu gosto, é aquela… não sei que eu sei como é que vocês chamam aí na nas outras regiões do Brasil, mas aqui chama de pezinho, que é aquele ajuste na base do cabelo pra dar um formato certo. Por alguma razão aquilo eu acho agradável. Porém, uma coisa que me incomoda muito, que eu detesto, é a gilete, principalmente, quando ela passa perto do pescoço. Não sei porque, mas eu acho que alguém vai cortar a minha jugular ali.

Otávio: É desagradável mesmo, viu? Assim, eu preferia que não fizesse, mas tem que fazer, tem que fazer.

Paulo: Ultimamente quem tem cuidado bastante disso é a Isabela, a minha esposa. Desde que começou a pandemia que eu não vejo cabeleireiro. Também não gostava muito de cortar com máquina. Nunca gostei muito da gilete também.

Michael: É engraçado vocês também da gilete porque no meu caso é de longe uma das coisas que menos incomodam. Talvez em parte também porque quando chega nesse ponto talvez o cara fura e corta o pescoço ele está fazendo um favor pra mim porque eu já estou numa puta agonia (risos).

Mas o maior problema vem primeiro de coisa líquida, seja água ou seja aqueles negócios esguichando e pegando às vezes frio, ás vezes quente, e há um monte de coisinha ao mesmo tempo e tipo… literalmente eu não consigo nem manter o olho aberto de tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo. Segunda coisa é coisa com textura pastosa e creme, essas coisas que a textura literalmente dá ânsia de vômito e o cheiro também me dá ânsia de vômito. Pior ainda, cheiro no geral um puta problema. Por sorte meu nariz é horrível, já tenho uma dificuldade natural de conseguir cheirar as coisas e ainda é foda quando eu vou no cabeleireiro porque é cheiro de umas trocentas coisas diferentes, tudo tem um cheiro que pra mim é muito ruim, muito difícil de eu… muito forte.

Toda vez que eu vou no cabeleireiro é uma batalha sensorial. Quando está chegando no final, na parte de usar navalha para fazer o pezinho fazer as coisas, é: “por favor cara, termina logo eu não estou aguentando aqui mais. Eu quero sair daqui, nunca mais voltar na minha vida para um lugar desses”.

Thaís: Eu acho engraçado que eu costumo ter a mesma sensação do Michael no final. Eu passo quase o tempo todo em que eu estou no cabeleireiro agarrada na minha cadeira, segurando muito firme nela, torcendo pra terminar logo. Às vezes a pessoa quer no final ficar me mostrando o corte, traz espelhinho pra mostrar pra lá e pra cá e a única coisa que eu penso é eu só quero ir embora, tá ótimo. Ou tá terrível, ou não importa, só diz que tá pronto e me deixa pagar e sair daqui.

Mas geralmente o meu grande problema nem é também com a parte de tato, de fios, que nem assim eu tinha perguntado. Tem a questão certamente do barulho. Tem a questão também do secador, aquele calor, aquele vento estranho sendo jogado na minha cara e vindo de vários lados diferentes. Mas eu acho que a parte que mais me incomoda é que sempre tem gente falando em volta. Às vezes o cabeleireiro tá sozinho comigo e ainda assim a pessoa não para de falar e eu não entendo porque a pessoa precisa ficar falando o tempo todo.

Um dos pontos também que eu acho que seria interessante a gente comentar é que o cabeleireiro costuma ser um ambiente muito social. Então costuma ter bastante gente ali falando sobre coisas bem aleatórias e geralmente sobre assuntos que absolutamente não fazem parte, pelo menos pra mim, dos meus interesses. Então eu queria saber como que vocês lidam com essa questão ali, aquele momento de esperar para ser atendido enquanto tem um monte de gente falando coisas muito aleatórias e o momento em que você tá ali na cadeira e o cabeleireiro tá tentando falar coisas com você.

Paulo: Essa é uma das coisas que eu mais detesto no cabeleireiro mesmo. Porque sempre tem uma conversa aleatória, sempre tem falar com gente que só não faz questão ou que às vezes é conhecido mas também não faz diferença na sua vida, sabe? Ou com gente que você nunca viu na vida também e ele puxa a conversa quando você só quer sair logo de lá. Quando eu era mais novo, eu ia cortar o cabelo com bastante frequência. Tinha dia que ia lá cortar o cabelo e via que estava cheio, já dava meia volta e ia embora (risos).

Otávio: Eu lembro a primeira vez que eu dominei a situação social de uma barbearia. Que que aconteceu? Eu estava lá cortando o cabelo e tal. E chegou é um senhor. Tinha uns oito homens juntos. Uns três cortando cabelo, incluindo eu e outros cinco esperando. E o cara foi falando, o cara foi falando assim: “ah, como o meu cachorro custa dinheiro, como o meu cachorro me dá custo, me dá gasto. Eu devia arrumar um filho que deve ser mais barato”. Eu virei pra ele e falei: você quer que eu prove que você está errado? Ele falou: como assim? Eu falei: “pensa assim. Você cria um cachorro e você cria uma criança, certo? Depois de 16 anos, o que que acontece? A criança vai pra faculdade. E o cachorro? O cachorro morre”. E todo mundo riu.

Michael: (Risos)

Paulo: (Risos)

Michael: Nada supera conversa de tiozão. No meu caso eu acho mais fácil quando tem mais gente assim, porque é muito mais tranquilo de você fingir que você está conversando. Só fica com “aham, ah é?”. “Sim, sim, não, ah é mesmo né?”. Acena com a cabeça tranquilo. Você está efetivamente não participando da conversa, mas para todos os efeitos e pra todo encargo social você está. Maravilha!

Mas ao mesmo tempo, se você chegar no cabeleireiro e tiver mais de uma pessoa lá dentro esperando, eu não tenho paciência pra se calar esperando. Então além de eu ir uma vez por ano, ainda tem que estar vazio. Só que daí se está vazio, só está o cabeleireiro lá e de repente é horrível porque o cara vai tentar conversar com você. E não tem como você estar fingindo que está conversando com uma pessoa.

Aí é aquele negócio horrível, aquela situação social horrível porque cara fica puxando conversa, cê não sabe como fugir disso, também você não quer ser mal-educado, ainda mais cara que tá com uma faca, pra todos os efeitos, na sua garganta…

Paulo: (Risos)

Michael: É dureza.

Thaís: Mas uma coisa que eu descobri e eu aprendi isso no cabeleireiro… Na verdade eu aprendi isso em um livro, e aí eu testei no cabeleireiro e funcionou, é você fazer perguntas pras pessoas em volta de você. Então você percebe que a pessoa quer muito falar. Então você faz uma pergunta sobre o que a pessoa está falando e ela começa a discursar sobre aquilo e você deixa ela discursando ali sozinha e aí você consegue não ter que se comunicar mais. Recomendo esse tipo de estratégia.

Otávio: O pessoal que conhece a gente, que ouve o podcast, vai começar a olhar a gente de outra forma, viu?

Michael: (Risos)

Paulo: (Risos)

Otávio: Caramba, a gente é muito maquiavélico, mano!

Thaís: A gente está encontrando jeitos de fazer nossa vida funcionar sem a gente ter que ferrar por causa dos outros.

Paulo: Macetes.

Thaís: Exato, macetes. Eu acho que uma das coisas que eu acho importantes a gente trazer no podcast é justamente esses macetes de como as pessoas podem tentar viver melhor. Então, conviver melhor com algumas situações que às vezes a gente é colocado ali e não sabe como sair dela (risos).

Bom, e falando então em comunicação, um outro ponto que às vezes é uma dificuldade e imagino que não só pra pessoas autistas, mas acho que pra gente um pouco pior, é comunicar exatamente o que que a gente quer pro cabeleireiro sem que o cabeleireiro comece a inventar coisas. Não sei se com homens é assim, mas comigo já aconteceu muito das pessoas quererem inventar coisas aleatórias no meu cabelo especialmente quando o meu cabelo está comprido. Parece que eles se divertem muito em fazer coisas estranhas.

E com vocês, como funciona essa questão de: olha, eu quero fazer tal coisa e a pessoa te entregar o que você quer?

Otávio: Assim, no meu caso, não é que o cara tenta inventar. É porque eu não consigo comunicar como eu quero o corte. Que que eu faço? Eu tiro foto toda vez que corto o cabelo. E falo assim: faz desse jeito, não faz desse jeito. Certo? Os caras também lá já sabem como é que é o corte. Entendeu? Eu dei até sorte nesse ponto. Mas essa parte é horrível, velho.

Paulo: Essa parte é péssima e é uma das coisas que me fez largar mão de tentar achar outro cabeleireiro. Eu tive um cabeleireiro lá na cidade onde meus pais moram, que me conhecia, cortava o cabelo desde criança. Eu era acostumado com ele e ele sabia o que eu gostava por boa parte da vida, até que eu comecei a me interessar por querer deixar o cabelo crescer e aí desandou tudo.

Comunicar é péssimo e tem sempre uns que querem inventar moda. Creio que isso não seja tão comum com homens e seja um problema maior para mulheres, mas ainda existe, né?

Thaís: Por que desandou tudo quando você resolveu deixar o cabelo comprido, Paulo?

Paulo: Ah, porque ele estava acostumado ao penteado curto e eu estava querendo deixar grande. E aí ele não não acertava o tamanho certo. Eu queria deixar os meus cachos definidos e sempre que eu ia lá perdia os cachos.

Michael: No meu caso, junta as duas coisas. Eu definitivamente não sei comunicar que tipo de corte que eu quero. Até porque isso daí pra mim é magia, é algo que não tem nenhuma pauta científica, então eu simplesmente assumo que não existe uma métrica para ter corte de cabelo. É algo que o cabeleireiro faz um vudu lá, uma mágica que deixa o cabelo lá bonitinho, tá. Literalmente eu já não consigo explicar pro cara como que eu quero que corta. E ainda por cima os cara tenta inventar. É horrível.

Acho que até hoje não teve uma vez que fui no cabeleireiro e eu saí de lá com um corte que eu estava esperando que eu queria fazer. E olha que isso que nos últimos anos, basicamente meu corte tem sido passar a máquina baixa aí porque eu não vou cortar pelo próximo ano. E ainda assim sai toda vez um jeito diferente. De um jeito diferente eu não sei o que os cara consegue fazer. Eu não sei da onde que de passar máquina nivelando aparecem trezentas mil ferramentas diferentes. Mas acontece. De novo, eu não entendo como isso funciona, pra mim é mágica.

Otávio: O mesmo cabeleireiro, a mesma cabeça, o mesmo cabelo, as mesmas tesouras, as mesmas ferramentas, os mesmos produtos, a mesma luz, a mesma posição, corte, nunca é igual! Está além da ciência. E sou eu falando isso.

Michael: Tanto é que eu estou indo na mesma via do Paulo. Só estou esperando pegar uma maquininha pra mim ou aprender a fazer esses vudus de cortar torcer e só a maquininha ser eficiente porque realmente cara, é foda, é dureza.

Thaís: Mas uma coisa que eu estava pensando a respeito: vocês já cortaram o cabelo de alguém? Porque eu não sei se é uma coisa da minha cabeça, mas encostar no cabelo das pessoas e naquele cabelo sendo cortado e caindo em você, pra mim parece uma coisa que só dá pra fazer com alguém que você goste muito, sabe? Porque quando eu corto o cabelo do meu namorado, beleza, eu não me incomodo. Mas eu me lembro que duas vezes o meu pai me pediu para cortar o cabelo dele. E vocês sabem que eu não costumo falar muito do meu pai. E quando eu falo nunca é bom, então esse é um dos exemplos, não não vai ser bom.

Michael: (Risos)

Thaís: E quando ele me pediu pra cortar o cabelo assim, pra mim pareceu uma situação pavorosa sentir aquelas coisas caindo perto de mim e eu ter que encostar na cabeça dele e passar maquininha ali. Não sei se vocês já tiveram uma sensação semelhante.

Otávio: Eu nunca cortei o cabelo de alguém. Eu nunca me atrevi, na verdade. Eu nunca quis arruinar a vida de alguém.

Michael: Inclusive muito obrigado, Thaís. Eu nunca tinha pensado que eu ia achar algo extremamente nojento, sendo que eu nunca tentei fazer.

Thaís: (Risos)

Michael: Você me provou, você me provou que isso é possível.

Thaís: De nada, Michael (risos).

Michael: Eu não corto o meu cabelo ainda, mas eu faço a barba. Um dos motivos que eu evito ficar fazendo a barba direto já é por isso. Porque quando eu decido cortar barba, primeiro que ela é ruim de pra caramba de cortar. Toda vez que eu corto vai uma e as vezes duas lâminas do barbeador pra conseguir cortar porque essa bagaça é dura pra caramba. E segundo, é horrível pra tirar esse negócio cortado do corpo. É pior que cabelo. Tem vezes que eu fico dois, três dias, eu tô esfregando o corpo e ainda tá saindo pelo da barba não sei da onde. Nossa é muito agonizante, é muito nojento!

Eu prefiro ficar com uma barba gigantesca mesmo, é melhor ser Papai Noel. É, pelo menos eu consigo emprego pelo menos no finalzinho do ano tranquilo aí, fácil. Não faço porque é uma situação social, né? Puta que pariu, mano. Mas enfim… (risos). É realmente incomoda muito.

Thaís: Eu imaginei.

Otávio: Sempre tem o da depilação a laser, gente. É definitivo.

Thaís: Ouvi falar que depilação a laser dura só um ano, mas eu espero testar em breve. Porque depilação é outro rolê. Eu nem vou entrar no mérito disso nesse episódio (risos). Só um comentário aleatório, é que eu realmente estou tentando imaginar criancinhas sentadas no colo do Michael.

Paulo: (Risos)

Otávio: Argh!

Michael: Argh! Por quê?

Thaís: Você falou de trabalhar de Papai Noel (risos).

Michael: Era melhor dormir sem essa… A conversa tá tomando um rumo…

Otávio: Velho, eu não conseguia imaginar outra coisa senão a coisa mais errada possível.

Michael: (Risos)

Paulo: (Risos)

Michael: O pior é que eu falei isso, mas eu não imaginei a coisa errada. É que a ideia de estar lá realmente fazendo essa função… nossa me deu uma puta de uma agonia. Imagina você ficar 4, 6 horas lá na porcaria de um shopping, num negócio vermelho quente pra caramba, criancinha subindo a tua perna e daí vai chuta vai… ARGH!

Thaís: Eu não imaginei nada errado tá? Eu imaginei exatamente isso que o Michael falou, que pra mim parece bem desesperador o suficiente (risos).

Michael: Um ponto que eu acho que dá pra tirar dessa conversa que é relevante pro tema é que por exemplo eu sempre tive muita dificuldade de explicar pras pessoas porque eu não gosto de cortar cabelo. Especialmente eu não gosto de ir no cabeleireiro. E justamente porque você tentar explicar isso, tentar verbalizar isso, realmente é um negócio que incomoda tanto que até o simples ato de você tentar verbalizar, explicar e raciocinar logicamente é horrível porque é um negócio muito ruim de se fazer.

Otávio: E você paga dinheiro por isso, véi! É um absurdo.

Thaís: Quando eu era pequena, era bem comum a minha avó me dar dinheiro pra eu ir no cabeleireiro. Ela pagava o corte e me pagava pra eu ir num cabeleireiro. Eram dois pagamentos separados, porque eu realmente não queria ir. E eu lembro claramente de uma vez a minha mãe ameaçando e ela sempre foi do tipo que cumpre as ameaças dela, então eu realmente aceitei e fiz o que ela mandou, que ela ameaçou cancelar uma viagem que a gente tinha de final de ano se eu não fosse cortar o cabelo antes da viagem. E eu realmente acredito que ela teria cancelado. Então eu aceitei cortar meu cabelo também.

Mas em relação a tudo isso que a gente está falando das dificuldades da gente cortar cabelo, queria saber se quando vocês eram crianças mais dificuldade com isso ou se exatamente a mesma coisa.

Otávio: A minha situação foi exatamente o contrário, a minha mãe estragou o meu cabelo. Você não faz ideia. Quando eu era pequeno, eu tinha um cabelo de tigela. Cara, a minha cabeça era mais lisa do que uma bola de bilhar. Você está entendendo? Imagina uma bola de bilhar marrom, a bola 7. A minha bola era mais lisa… A minha cabeça… a minha bola, nossa. A minha cabeça era mais lisa.

Thaís: (Risos) Minha bola era mais lisa. Foi muito bom também (risos).

Otávio: Tiago, eu te atrevo a não cortar isso.

Michael: (Risos)

Paulo: (Risos)

Otávio: A minha mãe um dia resolveu cortar meu cabelo para economizar um pouco de dinheiro. E foi o começo do fim, velho. Meu cabelo nunca mais voltou ao normal. Levou 15 anos para o meu cabelo voltar a ser homogêneo. Depois daquele dia meu cabelo parecia uma escultura impressionista. Você está entendendo? Puta que me pariu. Aí depois veio a época rebelde, veio a época do gel. Véi, eu usei tanto gel na minha vida. Vocês não fazem ideia. Eu parecia um porco-espinho.

Michael: Primeiro de tudo, gel está definitivamente na lista de substâncias que eu acho extremamente nojento. Eu não posso passar perto. Isso é praticamente qualquer substância gelatinosa. Dependendo da textura até literalmente gelatina mesmo, eu passo longe. Mas queria comentar que a minha relação com cortar cabelo na infância é bem simples. Está dentro das memórias que eu tenho reprimidas e eu não consigo acessar mais. Então eu não posso nem dizer pra vocês o quão ruim é porque o trauma foi tão grande que eu não lembro mais.

Paulo: No meu caso, eu comecei com uma criança chata pra cortar o cabelo. Minha mãe caçou um monte de cabeleireiros, até que teve um que conseguiu me acalmar. E aí eu permaneci indo lá por todo o resto da infância. Foi o mesmo cabeleireiro que eu tinha falado mais cedo. Então ia meio que obrigado pela minha mãe, mas ele eu tolerava. E era o que eu deixava tocar no meu cabelo.

Aí depois começou a idade mais rebelde, mas gel não funcionava pra mim, não. Então eu comecei a cultivar um black power até que eventualmente minha mãe me encheu o saco e me fez fazer um relaxamento no cabelo. Também foi algo muito bizarramente incômodo. Negócio que fede e dá uma sensação ruim. E aí depois fui me afastando disso e aumentando cada vez mais o intervalo para cortar o cabelo também.

Otávio: Gente, deixa eu fazer uma pergunta. Quais foram os cortes de cabelos mais doidos inspirados pelo entretenimento que vocês já quiseram ter?

Thaís: Nenhum.

Otávio: Mano eu sempre quis ter um cabelão espetadão assim, sabe? Estilo Jiraiya de Naruto. Não, falando sério, sem o rabo de cavalo. Mas daquele tamanho espetado daquele jeito. Eu não sei porquê, mas eu sempre achei aquilo foda pra caralho.

Michael: Eu sempre gostei da minha carinha de mendigo, então eu fico com isso mesmo.

Paulo: Ah, eu já quis ter o cabelo liso e longo. Meu cabelo sempre foi algo do cacheado tendendo pro crespo. Eu queria ter o cabelo que eu conseguisse fazer o headbanging enquanto ouço metal e ele se movesse.

Otávio: É porque você queria ser igual aos vocalistas do Calcinha Preta?

Michael: (Risos)

Paulo: (Risos) Pior que eu invejava o Wesley Safadão quando ele tinha cabelo longo. Era algo que eu nunca poderia ter.

Thaís: Não posso negar que era um cabelo bonito. A música não… não estou comentando a música. Eu estou comentando o cabelo.

Bom pessoal depois da gente falar sobre vários problemas aí que a gente já enfrentou diferentes pra cada um de nós ou parecidos, mas tem mais um ponto que existem algumas algumas instruções que a gente se encontra na internet, algumas dicas, tem cartilha de como cortar cabelo de crianças autistas e um dos pontos que são mencionados é a questão de a pessoa ter que ficar parada.

Inclusive um dos locais que eu cheguei a olhar indicava que você não segurasse uma criança autista enquanto ela precisa cortar o cabelo. Justamente pra evitar criar uma experiência traumática. Então tentar reforçar de outras formas aquele ambiente. Tentar encontrar um ambiente mais agradável, mais tranquilo e por aí vai. O que eu queria saber é se pra vocês teria uma mudança no ambiente que vocês pudessem falar: se eu pudesse mudar uma coisa dentre os vários problemas que a gente já comentou aqui, qual seria essa coisa que você mudaria no cabeleireiro pra ele ser um ambiente menos hostil.

Paulo: Olha, eu automatizaria todo o processo pra não ter que ter contato com ninguém. Não falar desnecessariamente e não ter mais gente falando desnecessariamente.

Michael: No meu caso se tivesse como ter um corte completamente a seco. Geralmente só a máquina e a navalhinha no final, sem líquido estranho tocando no meu corpo, nossa… Ainda assim ia ser horrível, mas pelo menos ia ser aturável.

Bem, eu acho que é uma ótima oportunidade pra gente terminar o episódio por aqui antes que terrores lovecraftianos da minha infância retornem em memórias que deveriam pra sempre estar seladas.

Thaís: (Risos) Michael está fugindo.

Michael: Bem, e como eu já tirei a deixa da Thaís aqui pra terminar o episódio, vamos então para a sessão dos nossos ouvintes pelo áudio do WhatsApp.

Tiago: Olá pessoal, aqui é o Tiago, eu vou ter que invadir a área aqui de recados pra poder contar na verdade duas notícias importantes. A primeira notícia é que agora eu sou apresentador de um outro podcast sobre autismo chamado Espectros – Autismo em Entrevista da Revista Autismo. Lá todo mês no dia 25, inclusive saiu o episódio hoje, eu entrevisto e converso com uma pessoa que seja relevante, que tem uma atuação histórica na comunidade do autismo para falar sobre vários temas não somente voltados ao autismo. Então dê uma procurada por Espectros, recomendo bastante.

E o segundo recado é que o mês de março foi o mês da mulher. Todo ano no Introvertendo, a gente faz episódios especiais e geralmente só apresentados pelas mulheres do podcast. Mas esse ano, por uma questão logística, a gente não conseguiu fazer isso ou era a gente pensar e investir um tempo pra fazer todo esse mês de março ou a gente comprometeria todos os episódios de abril e maio. Então a gente resolveu fazer episódios de abril e maio mais caprichados e fazer o que a gente sempre faz no mês de março como se fosse um mês qualquer.

Mas isso não significa que a data passou batido. A gente fez uma nova versão remixada do episódio 39 – Mulheres Autistas com a Thaís e com a Yara, que hoje é ex-integrante. Então você que ouviu aquele episódio e não gostou por causa da música, por causa de ruído e etc, tem uma nova versão nas plataformas com nova capa. É só procurar o nosso episódio 39 – Mulheres Autistas, beleza? É isso, pessoal. Falou.

Michael: E pra você quiser enviar seu áudio para a gente, nosso número no Zip Zizopt é (62) 99465-6787. Lembrando que o melhor áudio será tocado no episódio e é isso.

Thaís: Então agora que o Michael já roubou a minha finalização, tchau pra todos vocês e até mais.

(Fim do episódio)

Otávio: Eu vou falar só mais uma coisa, eu não gosto muito da tesoura, mas eu amo aquela máquina na minha nuca, eu não sei porquê. Acho que é porque eu era um cachorro na vida passada.

Michael: (Risos)

Paulo: (Risos)

Tiago: Tem uma página no Facebook falando de homens que ficam excitados quando o cabeleireiro faz o pé do cabelo…

Otávio: OK, acabou o episódio! Corta, corta, vaza! Tchau Tiago, tchau!

Michael: (Risos)

Paulo: (Risos)

Thaís: Meu Deus (risos)

Michael: Que específico! (risos)

Otávio: Eu caí numa armadilha que eu mesmo criei.

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Equipe Introvertendo Escrito por: