Introvertendo 132 – Valeu, Marcos!

Informamos que a partir de hoje o Marcos Carnielo Neto, um dos fundadores do Introvertendo, deixa a nossa equipe. Este episódio é uma forma de homenagearmos ele e dizer que vamos sentir falta.

Participam: Luca Nolasco, Michael Ulian, Otavio Crosara e Tiago Abreu. Arte: Vin Lima.

Links e informações úteis

Para nos enviar sugestões de temas, críticas, mensagens em geral, utilize o email ouvinte@introvertendo.com.br, ou a seção de comentários deste post. Se você é de alguma organização, ou pesquisador, e deseja ter o Introvertendo ou nossos membros como tema de algum material, palestra ou na cobertura de eventos, utilize o email contato@introvertendo.com.br.

Apoie o Introvertendo no PicPay ou no Padrim: Agradecemos aos nossos patrões: Caio Sabadin, Francisco Paiva Junior, Gerson Souza, Luanda Queiroz, Marcelo Venturi, Priscila Preard Andrade Maciel e Vanessa Maciel Zeitouni.

Acompanhe-nos nas plataformas: O Introvertendo está nas seguintes plataformas: Spotify | Apple Podcasts | DeezerCastBox | Google Podcasts e outras. Siga o nosso perfil no Spotify e acompanhe as nossas playlists com episódios de podcasts.

*

Transcrição do episódio

Tiago: A partir de hoje, o Marcos Carnielo Neto, um dos fundadores do podcast, deixa a nossa equipe. Este episódio é uma forma de contar pra vocês os motivos e fazer uma homenagem surpresa para o Marcos. Vamos lá?

(Abertura do Introvertendo)

Tiago: Quem conhece o Introvertendo há mais tempo sabe que este podcast surgiu em 2018, mas a nossa convivência enquanto autistas é ainda mais antiga. Um dia, o Luca, o Marcos, o Michael e o Otavio decidiram abraçar uma ideia que eu tinha: ser o primeiro podcast do Brasil feito por autistas.

E conseguimos isso. Muitas coisas ocorreram de lá pra cá. Viajamos pelo Brasil, ganhamos prêmio, saímos na TV e em jornais de destaque nacional, mas a vida também começou a soprar em diferentes direções. O Luca finalmente se encontrou no curso de Biomedicina. O Otávio está na fase final do curso de Medicina. O Michael largou sua graduação em Geologia e foi embora para o Paraná. E o Marcos também foi correr atrás do seus sonhos.

Antes de falar exatamente sobre a saída dele, eu quero contar detalhadamente como eu conheci o Marcos.

Quando eu obtive meu laudo de autismo em 2015, eu não conhecia outros autistas no meu dia a dia. Aí passei no curso de Jornalismo na UFG, procurei o Núcleo de Acessibilidade, e iniciei uma busca por outros autistas na instituição. O pessoal de lá me passou o contato de duas pessoas. O Renato, um estudante do mestrado, que até apareceu no episódio 42, e o Marcos.

Em abril de 2015, eu mandei um email para o Marcos, me apresentando e falando a intenção de escrever um artigo com autistas da UFG. Ele achou interessante, pediu detalhes, e eu mandei um textão. Ele nunca respondeu aquele email. Bem típico do Marcos.

Mas aí, em 2016, eu andando dentro do Instituto de Física para fazer um trabalho de fotografia, vi um certo sujeito arrumando uma mochila no corredor. Era o Marcos. Puxei conversa com ele, falei de um grupo de autistas que tinha na universidade e ele sentiu interesse em participar. Foi aí que, logo depois, o Marcos conheceu os outros e fundaria o podcast com a gente.

Um lado muito particular do Marcos é o fato de ele ser muito crítico. Na verdade, certamente ele prefere o termo “realista”. Isso sempre deu um toque a mais nas nossas interações. Nós costumávamos ir à terapia juntos. Primeiro, de ônibus, no sol quente. Quando eu tinha mais segurança para dirigir, ele ia de carona comigo. Marcos me ajudou a deslanchar em muitas coisas, inclusive no desenvolvimento de habilidade sociais em relacionamentos.

É óbvio que meus colegas fundadores do podcast não ficariam de fora, então o Otávio fez uma observação bem interessante sobre esse lado do Marcos.

Otávio: Eu lembro quando nós começamos a gravar, sabe? E cara, a gente usava ainda celulares pra fazer as gravações e tal. Era tudo muito, muito amador. A gente nem tinha espaço. A gente continua sem espaço, mas naquela época a gente ainda menos espaço. Cara, o Marcos era um dos caras que mais tinha paixão na voz,gravando os episódios, sabe? Eu não sei se ele vai achar graça no que eu vou falar agora, mas ele falava com ódio na voz, com um ódio assim, vindo do coração dele. Assim, cara, a voz dele durante a gravação do podcast era muito vivo, era muito engraçado e é uma pena que a gente não vai ter mais episódios assim.

Tiago: Acho que a melhor expressão para definir o estilo de discutir do Marcos é “cinismo gay”. Ele só não é um iconoclasta porque, pra isso, ele teria que perder a compostura. Tudo para o Marcos é uma questão de estilo. São as cores e formas dos prédios, a composição visual de suas roupas, a harmonia do clima. Para o Marcos, tudo tem uma forma de ser e estar. É algo muito correto, ao mesmo tempo disfuncional. Resumindo, muito autista. E o Luca concorda comigo.

Luca: Eu consigo me lembrar muito bem de diversos momentos que compartilhei com ele, dele sendo bastante ácido, que essa é uma característica que eu gosto muito, eu e ele criticando o Tiago em diversos momentos, falando que ele fala apenas de uma banda o tempo todo, ele é incapaz de falar de outras bandas sem mencionar ela e críticas desse tipo que nunca são por desgosto, nem nada, são mais uma demonstração de carinho e de afeto. E é essa a principal característica do Marcos pra mim, por mais que pra muitas pessoas ele possa ser visto como uma pessoa meio restrita e ácida, eu sempre vejo os comentários dele como simplesmente demonstrações de afeto, porque nunca ele tem um objetivo de machucar. Ele sempre tem um objetivo de falar o que ele pensa e muitas das vezes algo que ele pensa só é o que ele quer de melhor pra você. Então, novamente é algo que eu espero muito ter conseguido transmitir minimamente as qualidades que eu via nele e a alegria que ele me trazia enquanto nos encontrávamos. Eu sei que vai ser sempre intangível pra vocês, ouvintes, essa sensação que tinha quando eu encontrava com ele, quando estávamos todos juntos. Mas eu, de verdade, espero muito conseguir descrever minimamente o que era palpável ali, porque era uma sensação incrível que eu acredito que ele sempre traz pra todo mundo em volta.

Tiago: Todo mundo no podcast tem o seu estilo de humor. É, claro, alguns são mais comedidos, e outros mais disruptivos, como o Michael, nosso eterno gaivota. E o Michael também deixou uma mensagem falando do estilo de interação do Marcos.

Michael: A primeira coisa que me vem à mente quando eu lembro do Marcos é a forma descontraída de como ele conversava. Tanto dentro quanto fora do podcast, conversar com ele era sempre algo extremamente tranquilo e divertido de se fazer. Tanto é que alguns meus episódios preferidos que eu gravei foram os que eu gravei com ele, mesmo aqueles que não deram muito certo ou tiveram muito sucesso. Então, pra mim realmente vai fazer falta, ter essa oportunidade de gravar com ele.

Tiago: Bom, dados os créditos, vou contar logo o que ocorreu. Desde agosto de 2019, o Marcos foi embora para São Paulo. Ele abandonou o curso de Física Médica, que ele fazia desde 2013, para finalmente cursar o que ele realmente gostava, que era arquitetura. Já neste processo de mudança, estava bem difícil conseguirmos gravar. Nem sempre o Marcos tinha internet.

Em novembro de 2019, ele veio para Goiânia para fazer o Enem. O Marcos passou uns 3 dias aqui em casa e deixou 7 episódios pré-gravados, para lançar aos poucos. E, enfim, ele passou na USP. Depois disso, veio a pandemia. O Marcos teve que ir para um local coletivo da universidade, sem internet, com muita gente. Estava impossível gravar com ele.

Durante todos esses meses, fizemos lançamentos leves. Janeiro Branco, Lidando com o Perigo, Autistas na Cidade Grande e Autistas Ex-Evangélicos foram os episódios liberados aos poucos. E eu aproveitei falas do Marcos num episódio descartado gravado em 2018, que não tinha ficado muito legal, e transformei no Autistas em Apps de Relacionamento.

No meio deste processo, todos nós já tínhamos a consciência de que não seria possível gravar coisas novas com o Marcos. Nem pelos próximos dias, nem pelos próximos meses e talvez até nem no próximo ano. Foi aí, então, que conversamos e chegamos a conclusão de que era necessária uma despedida.

Luca: A minha fala, pelo menos, vai ter um teor um pouco mórbido, como se o Marcos já não estivesse mais entre nós ou alguma coisa assim. Todos nós sabemos que não é esse o caso, mas eu acredito que é esse o efeito porque é impossível não ser melancólico com ausência de uma pessoa importante como Marcos, de uma pessoa marcante como ele tende a ser. Por mais que seja uma despedida comum, eu acredito que a ausência que ele vai ter pro podcast, tanto na influência quanto na sua participação, pro grupo, pros episódios, é incalculável. Não poder ter mais a participação dele, pra mim, é algo muito impactante.

Tiago: O Luca resume o sentimento de todos. Não é fácil abrir mão de um talento como o Marcos. E eu, Tiago, considero que, uma das formas de valorizar as pessoas que um dia estiveram ao nosso lado, é saber como se despedir. Esta é a nossa forma de agradecer o Marcos por tudo o que ele fez com a gente, e dizer que vamos sentir muita falta.

Otávio: Mano, boa sorte em qualquer que seja o caminho que você seguir. Eu tô falando com se a gente fosse nunca mais se ver, mas eu desejo boa sorte assim mesmo.

Luca: Eu espero que ainda ele possa participar de diversos outros episódios sempre que for possível, sei que no momento não é, e que ele sempre vai ser bem-vindo pra voltar quando for possível.

Michael: Inclusive eu quero aproveitar aqui porque desde que ele se mudou pra São Paulo eu não tive oportunidade de desejar sucesso pra ele no que ele vai tá fazendo agora e torcer pra que tudo fique bem pra com ele, que tudo dê certo. Então tá aí o meu abraço aí, meu boa sorte pro Marcos nessa nova fase da vida dele.

Tiago: O Introvertendo, a partir de hoje, segue sendo um podcast formado por 9 autistas. Nós voltamos na sexta-feira. Até mais.

Site amigo do surdo - Acessível em Libras - Hand Talk
Equipe Introvertendo Escrito por: