Introvertendo 15 – Sofrência

Lenços na mão, rosto borrado, conversas antigas no celular e álcool no sangue, hoje é dia de chorar pelo amor que se foi. Nossos podcasters contam sobre seus amores platônicos de infância, os relacionamentos da vida adulta que não deram certo e o que fazem para superar a dor de não ter mais, em sua vida, aquela pessoa tão importante e querida.

Participam desse episódio Guilherme PiresLetícia Lyns, Luca Nolasco, Otavio Crosara e Tiago Abreu.

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Transcrição do episódio

Tiago: Um olá pra você que ouve o podcast Introvertendo. Nós estamos aqui hoje pra falar de sofrimento, tristeza, mágoa e desilusão. Um episódio sobre sofrência. Meu nome é Tiago Abreu e na hora da tristeza eu ouço músicas do Radiohead baseadas em piano pra poder chorar.

Otávio: Meu nome é Otávio e quando eu estou na sofrência eu escuto músicas da Taylor Swift. Gostaria de deixar claro que estamos fazendo o episódio de hoje não porque estamos na sofrência. Todo mundo aqui está num relacionamento feliz, menos o Tiago.

Leticia: O meu nome é Letícia, amor de cu é rola, mas pelo que eu entendi todo mundo aqui tá num relacionamento?

Tiago: Exceto eu.

Luca: Exceto o Tiago.

Leticia:  Mas estamos todos num relacionamento, vocês entenderam isso?

Tiago: Eu estou num relacionamento com a solidão.

Luca: Eu sou o Luca e depois que eu terminei o ensino médio eu já não tenho mais direito de dizer que eu sou niilista.

Otávio: Ele amadureceu.

Luca: Eu evolui, parei de escutar Pink Floyd.

Otávio: Eu estou num relacionamento. Jordanna, um beijo!

Luca: Alô Mariana!

Guilherme: Eu me chamo Guilherme e na hora da sofrência eu escuto Kenny G.

Leticia:  Nossa, pelo menos não é Lionel Richie.

Bloco geral de discussão

Otávio: Ah, quantos episódios de sofrência eu já sofri. Eu lembro até os nomes. Débora. A primeira menina porque eu tive uma quedinha quando eu tinha o que uns oito anos. Aí quando eu ia me confessar pra ela. ela saiu do colégio. Eu até hoje eu me pergunto se ela sabia disso. A segunda foi a Fernanda, que era uma menina alta de olhos claros, uns doze anos.

Tiago: E você tinha quantos anos?

Otávio: Uns doze. Obrigado por me salvar mais uma vez. Ano vai ano, Ingrid. Depois Tuiane, outra menina de olhos claros.

Luca: Tem uma certa predileção aí.

Otávio: Não, ela tinha um rosto bonito, bem gordinha. A Fernanda tinha um rosto magro. Eu nunca liguei muito para olhos. Até porque olhos claros são muito sensíveis a luz solar, eles são mais suscetíveis a ficarem cegos.

Tiago: Grande coisa a pensar na hora de iniciar um relacionamento.

Leticia:  Muito obrigado pela dica.

Otávio: Seus olhos são claros?

Leticia:  Ah não, chega mais perto querido.

Tiago: Os olhos dela são verdes.

Leticia:  Você nunca reparou? A gente é autista, nunca olha no olho né.

Otávio: E depois disso, vem umas quarenta, sabe.

Luca: Foi pra cada trimestre, né.

Tiago: Assim você parava de gostar de uma e você já interessava em outra.

Otávio: Parar é uma palavra muito forte. Você está menosprezando minhas experiências amorosas. Vai se foder. É porque eu sempre fui uma pessoa que sempre que muito atrás de significado, sabe. Eu sou o Otávio, mas eu sou o que? Eu não namoro. Não saio. Eu só alterno entre casa e colégio, casa e colégio. Eu me apegava a qualquer coisa que trouxesse o mínimo de significado para mim. E nesse sentido essas meninas serviam como um meio de fuga. Como diz a música do Zeca Pagodinho, já tive mulheres de todas as cores, de várias idades, de muitos amores.

Luca: Falando sobre o que o Otávio tinha dito, quando eu era pequeno (e vejo isso até hoje), eu sempre senti uma necessidade muito grande de atenção. Mas não atenção das pessoas me louvarem e tudo mais. É só de ter alguém com quem conversar, sabe? E como eu não me dava bem com quase ninguém, qualquer pessoa que preenchia minimamente esse requisito já era uma paixão pra mim. E eu só soube como começar a lidar com isso muito recentemente, já com 16 anos por aí. Foi bem próximo.

Otávio: Quando eu entrei na Faculdade de Medicina, eu acabei namorando com uma menina e nos dávamos muito bem. Estávamos muito apaixonados. Nós dois éramos pré-adolescentes em paixão. Caramba, eu sofri demais por essa menina depois que nós terminamos. Não por ela, mas por o que ela representava. De que eu tinha superado todas as minhas dificuldades sociais. Eu diria que a sofrência de um relacionamento é isso

Tiago: Eu acho que isso encaixa muito com a questão platônica, dos amores, principalmente da época de criança e adolescente. Eu tive duas paixões assim nesse sentido mais marcante uma foi quando eu estava na segunda série, eu tinha oito anos. E tinha uma aluna da sala que que ela era muito quieta. Não conversava com absolutamente ninguém e eu era a pessoa que ficava ali sofrendo bullying e sendo zoado por todo mundo. Só que eu não tinha coragem de conversar com ela. E as minhas formas de ficar perto dela eram tão assustadoras que eu acho que ela pensava que eu era um psicopata alguma coisa assim.

Otávio: E nós também achamos.

Tiago: Nós convivemos durante um ano mais ou menos assim na mesma turma. E eu nunca declarei pra ela. Mas eu acho que no depois ela ficou sabendo e tal. E deu merda.

Otávio: Mas tenha fé Tiago, porque ela está ouvindo o Introvertendo agora.

Leticia: Sempre dá merda.

Tiago: Aí eu e a minha segunda situação. Quando eu era pequeno, isso já foi já na pré-adolescência, tinha uma aluna que ela era bastante popular na escola. Ela até conversava comigo de vez em quando e até morava perto de casa, ela mora perto de casa até hoje. Um quarteirão acima. E eu até vi ela depois de muitos anos, na época do cursinho antes de entrar na universidade. Mas eu sempre fui uma criança e um pré-adolescente muito imaturo e muito religioso. Pior combinação possível em termos comportamentais no ambiente de escola. Então eu gostava dela e eu acho que ela não, tenho certeza que ela não tinha menor interesse. Ela era uma pessoa popular. Um monte de gente gostava dela. Um dia ela chegou com umas amigas, antes do início da aula e uma amiga dela chegou pra mim e falou assim: “Não, vem aqui comigo que eu preciso conversar com você.”. Quando eu cheguei lá, eu cheguei em frente dela e estavam as amigas dela também. E ela perguntou, “Você gosta de mim?”. Eu falei sim, aí todo mundo em volta começou a rir, e eu fiquei extremamente sem graça. Aí foi nessa época que ela começou a namorar um emo, um emo de 17 anos. Ela tinha 12 ou 13, era extremamente bizarro. Depois dessas duas situações eu não tive mais nenhum nenhuma paixonite, digamos, assim. Só que eu não levo esses amores a sério. Então quando eu quando eu cheguei aos 18 anos, eu tinha uma plena consciência que eu nunca tinha me apaixonado de verdade por ninguém, mas enfim, aí depois eu vou falar sobre as coisas que aconteceram na vida adulta.

Luca: É engraçado que a primeira vez que eu que eu cheguei à conclusão de que apaixonei de verdade foi quando eu vi a reciprocidade da pessoa e das outras vezes era só sentimento platônico que eu sabia que com pouco tempo é acabar superando sendo difícil não. Mas quando ocorreu de fato me apaixonar. Foi uma situação um pouco complicada depois.

Tiago: Entendemos esses sentimentos.

Luca: No período é não só foi a paixão como sentimento de falta que foi. Já superei tudo.

Guilherme: No meu caso foi diferente. O primeiro amor a gente não esquece. Ela morava do outro lado do quarteirão da minha casa. Eu moro até hoje lá, inclusive. Foi na sexta série. Sem citar nomes, eu lembro como se fosse ontem, sentava atrás dela. Um dia eu me declarei para ela. Tentando manter uma conversa particular, mesmo dentro da sala de aula. Ela não lidou bem e acabou comigo verbalmente, gritando e xingando, com todo mundo dentro da sala ouvindo. Fui pedindo para ela com educação para ela parar. Mas a situação parecia que só piorava. Num ponto que eu acabei estourando de raiva. Gritando e xingando ao ponto de até chorar.

Leticia: Quando eu tinha dez anos, eu entrei para o colégio militar. Eu sempre tive muita dificuldade de relacionar com garotos. Então, normalmente eu tinha era mais amigas ou ficava sozinha. Ou ficava com as pessoas que eram umas três vezes mais estranhas. Nessa época, um menino começou a sentar atrás de mim. E ele parecia muito comigo. Eu tinha os olhos verdes, ele também. A gente tinha o cabelo da mesma cor. Parecíamos gêmeos. Ele sabe essa história inclusive. Eu já fiz um vlog contando essa história e ele assistiu. Eu mandei pra ele e nós rimos juntos foi, foi bem legal. O nome dele era Leonardo e o meu era Letícia. Presta atenção. Na minha cabeça, a gente era parecido fisicamente. Até nossos nomes eram parecidos, o que faltava?

Tiago: Vocês terem pais com o mesmo nome?

Leticia: Não!

Guilherme: Serem do mesmo sexo? (risos)

Leticia: Também não! A gente fazia aniversário no mesmo dia. 12 horas de diferença entre cada um. Eu fui analisando tudo. Aí eu falei: Só pode ser coisa do cosmos. Porque a gente é alma gêmea.

Tiago: O cupido pegou forte você ali!

Leticia: E eu invoquei que era destino. Que esse menino era o cara. 10 anos de idade. Eu fiquei apaixonada por ele por muito tempo.

Tiago: Vocês chegaram a se pegar?

Leticia: Não porque ele me achava estranha.

Otávio: Você também se acha estranha.

Leticia: Sim, mas de uma forma positiva. Eu acho uma coisa super legal. Mas ele me ignorava. Comecei a escrever cartinhas pra ele, porque eu não tinha coragem de falar com ele e aí eu deixava bilhetinhos e tal. Depois, eu fiz o que eu sempre faço e o que toda pessoa normal faria. Ou não. Fiquei amiga dos amigos dele, pra aproximar.

Otávio: Achei que você ia falar que cortou os pulsos.

Luca: Eu jurei que ela ia falar também. Caraca!

Tiago: Só um adendo. Você falou sobre a questão de escrever cartas. Eu esqueci de contar que a segunda menina, que eu gostei que foi da época da pré-adolescência, uma forma minha de mostrar carinho pra ela foi escrever uma carta no Word colocando no disquete e dei o disquete pra ela.

Luca: Isso aí é futurismo.

Tiago: E anos depois, isso foi em 2014, ela chegou pra mim num dia que a gente estava no ônibus e ela falou assim: “Eu tenho seu disquete até hoje”.

Luca: Isso é fofo. Eu já recebi carta quando eu tinha 15, 16 anos. Eu fiquei pelo menos uns 3 anos mandando cartinha e falando que gostava dele. E ele na época era afim de um patricinha da sala. Marlene.

Tiago: Geralmente quase todos os meninos sempre gostam de uma só garota da turma.

Leticia: Isso, que a sala inteira quer.

Tiago: Depois ela se acha. E as vezes nem é tão bonita assim.

Leticia: Mas nesse caso ela era linda sim, também não era metida nem nada do tipo. Extremamente inteligente, até hoje. E eu acabava me espelhando nela. Via o interesse dos garotos e pensava: Eu tenho que ser como ela e as amigas dela. Pintei o cabelo de loiro, como o delas. Lógico que não ficou loiro mesmo, ficou quase laranja na verdade. Como não fiquei satisfeita, cortei a franja também. Não foi o bastante. Então eu alisei o cabelo. Assim, eu apareci na escola totalmente diferente, parecendo outra pessoa. E ele continuou não prestando atenção em mim. E com o tempo passando, acho que quando eu tinha 14. Ele ficou afim de uma outra amiga minha. E essa era amiga minha. E o que eu fiz? Virei para ele falei “Você quer que eu te ajude?”. Com a mentalidade de que se eu ajudasse ele, ele começaria a gostar de mim. Ele negou a ajuda e ainda assim eu fiquei insistindo.

Luca: Daí você vira para sua amiga e fala “Me empresta tua boca, vem aqui.”.

Leticia: Tanto é que no dia que eles iam ficar, eu fiquei em cima de ambos. Eles lá sozinhos e eu toda hora indo atrapalhar. E ele me olhando com a cara de “o que você tá fazendo aqui cara”.

Otávio: Como uma mariposa olhando para luz.

Leticia: Tipo isso, ou um gnomo aparecendo assim do nada, no cantinho. Com isso eu comecei a analisar meu comportamento e pensei comigo, “Letícia você está parecendo uma psicopata, para com isso.”. E eu fui desencanando dele, até que um dia, ele me chamou de “Léti”. Chamou pelo apelido, gozei. Cheguei a escrever isso no meu diário. Só que aí, apareceu um Deus grego na escola. Esse eu não vou falar o nome não. Jogador de basquete, olho claro e tudo mais. Quero.

Tiago: E aí você começou a encontrar na vida dele elementos que combinavam com você.

Leticia: Não! Antes disso eu comecei a perseguir ele na escola. Onde ele ia, eu também estava. E como da outra vez, para me aproximar, fiquei amiga dos amigos dele. Uma coisa vai levando a outra e… Continuei solteira, pois não deu em nada. Acho que ele achou que eu era doida. Sabe aqueles colarzinhos com letras que vendem na rua? Eu comprei um com o nome dele e um coração. Dei para ele e ele não aceitou, óbvio. E eu fiquei muito triste, eu já estava decepcionada por causa do Leonardo.

Tiago: E quando ele te chamou pelo apelido, ficou por isso mesmo?

Leticia: Sim. Ele me iludiu. Assim, eu fiquei deprimida, pensando assim “Vou morrer solteira.”. E quando eu fiz quinze anos, comecei a olhar de uma forma diferente para meu melhor amigo e vizinho. A gente começou a se aproximar, até que começaram a falar que ele gostava de mim. E como eu já estava apaixonadinha por ele. Eu me apaixonava muito fácil.

Tiago: Deu para perceber.

Leticia: Apaixonava! Que fique bem claro. Nós éramos melhores amigos, eu sabia tudo dele e ele tudo de mim. E eu comecei a perseguir ele também. Descia do meu apartamento para o prédio em que morávamos todos os dias. E quando eu me mudei, mas ainda estava por perto, eu continuei indo lá sempre que podia. Para vê-lo jogando bola. Até um dia que ele estava jogando basquete. Eu pedi para ele me ensinar a jogar. E nisso aconteceu aquela primeira troca de olhares e eu esperando a reação dele.

Luca: O Otávio ficou tenso de antecipação aqui.

Otávio: Só estou encenando.

Leticia: Com o povo falando que ele gostava de mim constantemente. Eu acreditei. E quanto mais falavam para mim, mais eu gostava ele.

Tiago: Mas ele não gostava?

Letícia: Calma, vamos chegar lá. Chegou o dia em que eu falei, “Vou tomar coragem.”. E eu achava que ele tinha medo de mim. Visto que eu sempre estava na cola dele, sempre que eu ia no prédio visitar a minha madrinha, eu olhava na janela do quarto dele para ver se a luz estava acesa, para se ele estava em casa. E se ele estivesse eu o chamava para descer. E um dia, ele estava subindo e eu sai correndo atrás dele. Ele entrando no elevador e eu “Espera, espera.”. Ele perguntou o que eu queria e eu disse que queria saber se era verdade que ele gostava de mim. Ele só fez que não com a cabeça e foi embora.

Guilherme: Caralho…

Leticia: Calma que eu vou chegar lá. Com isso, fiquei triste para caralho, de chorar e tudo. Mas não acreditei. Pois depois de uns dias a gente voltou a se falar normalmente, como se nada tivesse acontecido. E a gente voltou a brincar normalmente, eu tinha quinze anos na época e ele treze, apesar de ser muito mais alto do que eu. Até que um dia chegou os amigos e o irmão dele, que tinham uns dez anos na época, dizendo “Letícia, Letícia! O Gustavo vai se declarar para você hoje!”. E eu fiquei sem reação. Daí quando ele chegou, eu já toda tremendo, com o estômago na garganta. Com os amigos e o irmão dele em volta. Com ele todo sujo e balançando a perna de ansiedade. Ele disse “Hoje não, eu estou todo sujo e tem muita gente em volta.”. E eu falei que ia embora. E quando eu fui saindo ele veio atrás de mim e perguntou, “Você quer namorar comigo!?”. Eu pedi para ele repetir e ele disse novamente num tom menos confiante. Eu disse, “Vou pensar no seu caso.”. E fui embora para casa. Depois eu mandei uma mensagem no celular dele, dizendo que queria. Na mesma hora. A gente ficou juntos por dois anos. E essa foi a única paixonite minha que deu certo durante a adolescência, já que não dava para namorar com o Justin Biber. E apesar de eu ter outras histórias, não compensa ficar contando, pois se não vai virar um episódio só de eu falando. E isso que eu nem cheguei na parte dos meus dezessete anos. Mas me deixa ver seu eu consigo recapitular as minhas sofrências até os quinze. Teve meu primeiro beijo com o Felipe que foi super nojento. Pois ambos usávamos aparelho, eu não tinha escovado os dentes, ele também não.

Luca: Saiu faísca né?

Letícia: Caralho, foi horrível. E eu tinha treze anos.

Tiago: Nossa, seu primeiro beijo foi com treze anos?

Leticia: Com treze anos. Para você ver como sou evoluída.

Tiago: Meu primeiro beijo foi com sete.

Leticia: Nossa, então eu não sou tão evoluída assim.

Tiago: Foi com uma vizinha. O irmão dela era como se fosse meu melhor amigo na época.

Leticia: Primo conta?

Luca: Sei lá, acho que não.

Leticia: Então foi com treze mesmo.

Tiago: Continuando, ela era mais nova que eu, tinha seis. Só que a boca dela era toda cheia de cáries.

Leticia: Você ficou olhando dentro da boca dela?

Luca: “Abre a boca, vem cá.”.

Tiago: Como eles eram meus vizinhos, eu a conhecia fazia tempo já. Ela era uma menina muito bonita, loira, dos olhos claros, apesar dos dentes fodidos. E aí um dia, estávamos só nós na casa dos meus pais, e sem motivo ela me agarrou e me beijou. Debaixo do pé de manga.

Letícia: Que romântico, primeiro beijo debaixo do pé de manga.

Luca: Acho que eu tinha uns dezesseis para dezessete quando eu beijei pela primeira vez. Mas mudando de assunto rapidamente. Qual a definição pessoa que vocês têm por amor e paixão?

Leticia: Olha, eu vou ter que reencarnar mais umas três vezes para descobrir. Acho que paixão é algo mais passageiro né?

Tiago: Acho que paixão é algo mais voltado para o desejo sexual. E apesar de o amor poder incluir a paixão dentro dele, ele precisa de mais atributos para se formar.

Otávio: Na paixão você bate uma punheta ou siririca e esquece a pessoa. No amor, você consegue bem mais.

Leticia: Nem sempre.

Tiago: Você pode sair da vida da pessoa, mas nunca das punhetas dela. Então…

Luca: Para mim é um conceito diferente. Paixão é um sentimento mais imediatista, de quando você acaba de conhecer a pessoa e tudo aquilo é novo. De sentir borboletas na barriga ao ver a pessoa. E amor parece mais o carinho que você tem por uma pessoa que você já conhece a muito tempo. Como amor de mãe. Você gosta dela, mas não fica tenso só de ouvir a voz dela. Só carinho mesmo.

Otávio: Então se você convive com uma pessoa por 40 anos e toda vez ela fica ansiosa por te ver, ela nunca te amou?

Luca: Não. Você pode amar uma pessoa e ser apaixonado por ela.

Tiago: Mas é muito pouco provável.

Luca: É, depois que chegou na fase de cagar de porta aberta, fica difícil.

Otávio: Vocês não acreditam no amor.

Leticia: Eu nem sei o que é amor ainda. Para mim amor genuíno é amor de mãe para filho. Mas se eu fosse definir, para mim amor é quando você quer que a pessoa seja feliz, independente de ela estar perto de você ou não. Eu acredito no conceito de quem ama liberta. Se o melhor para pessoa é partir, se você ama ela você vai aceitar isso. Não acho que só exista amor na reciprocidade.

Luca: É, o amor platônico também existe.

Leticia: Sim, mas não falo só disso. Por exemplo, uma mãe que faz de tudo pelo filho e ele está pouco se fodendo para ela. Mas eu que o diga de amor platônico.

Luca: Então, você já tomou o fora, você está mal. O que vocês fazem?

Otávio: Olha, beber não vai ajudar.

Tiago: Eu geralmente ouço músicas tristes como falei no início, muito britpop dos anos noventa no geral. Essas coisas depressivas são minha trilha sonora.

Leticia: Eu já faço o contrário. Eu não fico depressiva primeiro. Tomei um fora? Foda-se, tem quem quer. E eu saio, saio vou encher a cara com meus amigos. Daí passa dois dias e eu estou chorando de querer cortar os pulsos. Com muita raiva. Em posição fetal debaixo do chuveiro quente, as vezes batendo uma, porque né.

Tiago: A chorunheta.

Luca: O masturbanho.

Leticia: A chorunheta! Vocês já se masturbaram e choraram depois?

Luca: Não, eu acho que é um nível que eu ainda não atingi.

Letícia: Nossa, isso já aconteceu muito comigo.

Otávio: Eu nunca cheguei num nível de ver um pornô tão decrépito que me fizesse chorar.

Leticia: Mas você não precisa ver pornô para isso.

Tiago: A chorunheta não vem na hora de ver pornô. Ela vem no momento da sua vida que você está destruído após um relacionamento.

Otávio: Eu não conhecia nem esse masturbanho nem esse chorunheta.

Tiago: Eu achei bastante interessante o que a Letícia falou no outro bloco. De que amar às vezes significa deixar a pessoa ir embora. Isso aconteceu comigo, na única vez em que eu me apaixonei na minha vida adulta. Contextualizando. Até os meus dezoito, eu não tinha amigos. E aos dezoito eu fiz três amigos muito importantes para mim. Aliás, abraços ao Fábio, Paulo e Victor. E eles me incentivaram muito nesse processo de conhecer pessoas e tentar ficar com alguém. Já que todos eles ficavam e eu não. E a partir de certo momento eu passei a usar o Tinder, inclusive incentivado pelo Marcos que também participa do podcast.

Otávio: Que não aparece faz uns oito episódios.

Tiago: O último que ele aparece é o sete. Depois de alguns flertes, de conhecer algumas pessoas, de algumas relações mais íntimas, eu conheci uma pessoa da universidade, a qual eu não vou citar o nome ou outros detalhes. Inclusive é uma pessoa que começou a conversar comigo por causa do podcast. No comecinho da produção do Introvertendo, eu tinha colocado no Tinder que eu era podcaster. E essa pessoa gostava muito de podcasts. Ela se interessou pelo projeto e a gente começou a conversar sobre uma série de coisas ao ponto em que ela disse que estava gostando muito de conversar comigo. E eu tinha perguntado aos meus amigos, minutos antes, qual o momento certo de chamar uma pessoa para sair. Eles falaram para observar os sinais da pessoa. E eu respondi que se eu estava perguntando, era porque eu não sabia fazer isto.

Otávio: Mas isso não é um problema exclusivo de autistas, é um problema da humanidade. A mulher pode estar com um letreiro na testa dizendo me beija desgraçado e você pensa, “Será que ela me vê só como amigo?”.

Tiago: E quando a pessoa falou que ela estava gostando muito de conversar comigo, eu perguntei para ela se ela não gostaria de se encontrar comigo algum dia, na universidade mesmo. E ela aceitou de nos vermos logo no dia seguinte. E a gente tinha algumas pessoas em comum, pertencemos a mesma instituição. A gente se encontrou num bar, acabamos bebendo para caramba e conversamos muito. E nessa conversa descobrimos que tínhamos mais um contato em comum, minha prima. O que me surpreendeu pela aleatoriedade. No mesmo dia a gente se envolveu bastante, nos identificamos fortemente um com o outro. O que gerou uma relação muito intensa no início por ambas as partes. E até agora, essa foi a única pessoa com quem me envolvi que me aceitou como eu era. Que sempre foi tranquilo e compreensivo comigo. Além das características em comum. Porém a gente se conheceu no que provavelmente era o pior momento de nossas vidas. Eu estou no TCC, com problemas de humor e complicações no tratamento. E essa pessoa também estava com problemas similares. E quando você tem duas pessoas emocionalmente instáveis juntas, é extremamente complicado para que um forneça o suporte que a outra parte necessita. E foi o que aconteceu, a gente teve um episódio muito complicado. E apesar de estar ali para ajudar essa pessoa, minhas ações não foram o suficiente para manter um clima bom e até mesmo agravaram a situação. Chegando ao ponto de eu me questionar se não estava fazendo mais mal do que bem para essa pessoa. Ficando inseguro ao perceber como as coisas não estavam indo bem. Mas mesmo estando no nosso pior emocionalmente, a gente não queria falar sobre isso visto a boa relação que tínhamos desenvolvido até aquele momento. Durante desse período, pelo menos para mim a gente sempre conseguiu manter o carinho e o respeito um pelo outro. No fim, percebi que talvez, a pessoa ficaria melhor sem mim. Porém, antes de conseguir conversar com essa pessoa sobre, ela me excluiu da vida dela. E apesar de ter ficado magoado de início, eu entendi que era uma situação de fragilidade e que provavelmente aquilo era necessário. Essa foi a primeira vez na qual eu realmente me senti apaixonado por alguém. Eu até hoje penso nessa pessoa. Se ela está bem e o que estaria fazendo, se teve sucesso em resolver tal problema. Guardando em minha memória tudo que conversamos e os dias que passamos juntos. E apesar de ser algo triste para mim e eu ainda amar essa pessoa, se ela estiver ouvindo esse episódio, eu queria agradecer por esse tempo que passamos juntos. Porque inclusive essa pessoa foi um dos nossos primeiros ouvintes. E no fim, concordo com a Letícia, quando as coisas não dão certo, amar é deixar a pessoa ir. Por mais dolorido que seja.

Luca: A minha história com minha primeira namorada é bastante similar a do Tiago, então não vou recontar. Mas a parte mais difícil para um casal e que eu demorei a perceber, é que a pessoa, de preferência ambas, consigam compreender quando aquele relacionamento deixa de fazer bem para elas. E que se torna necessário que se afastem um do outro. Isso pode ocorrer de uma forma extremamente brutalista e dolorosa.

Tiago: Que é o corte.

Luca: Isso. Esse corte abrupto, com bloqueio nas redes sociais e tudo mais. Ou pode ocorrer de forma dialogada baseada na percepção das pessoas envolvidas. O diálogo é extremamente necessário.

Tiago: Foi o fato de ter sido excluído sumariamente da vida dessa pessoa que foi o que mais pesou para mim. Acho que se tivéssemos conversado sobre isso antes de encerrar o contato, creio que eu teria ficado muito mais em paz nesse sentido. Até para que ela pudesse contar qualquer mágoa que tivesse de mim na minha frente para que eu pudesse me desculpar e tudo mais. Mas também, a gente não pode sempre controlar como as coisas terminam. E sempre procurar um limite entre a gente e o outro, visto que isso nem sempre depende exclusivamente dela, mas do ambiente a qual ela está inserida. Por exemplo, se essa pessoa vive num ambiente com pessoas próximas que são extremamente tóxicas, da qual ela não pode se livrar. Não há muita coisa que se possa fazer para ajudar essa pessoa. É uma situação extremamente delicada. No fim, eu vou continuar amando essa pessoa, já passou um mês disso e a gente acabou se encontrando inclusive. Foi uma conversa muito respeitosa. Fui muito bem tratado, o que me tranquilizou. Mas sempre sobra a sensação de que eu poderia ter feito mais.

Luca: Essa sensação sempre vai ter. Mas acho legal que você já tinha essa percepção de que a situação não estava legal e que o término era necessário. Com o tempo, essa sensação de vazio de amor, vai melhorar.

Tiago: Agora, uma situação engraçada. Quando eu tive esse corte na minha vida, eu decidi que eu não iria atrás de outros relacionamentos e focaria apenas no meu TCC e outros trabalhos pessoais. Mas um amigo falou, “Não, reativa o Tinder, vai conhecer gente nova.” e tudo mais. Eu dei outro match, marquei de me encontrar com a pessoa e quando estava no ônibus a caminho, passa um carro, tocando uma música chamada “Largado às Traças” a qual me lembrava muito aquela pessoa. Então, se você mora em Goiânia, e quebra relações com uma pessoa que gosta muito de sertanejo, esse é um dos piores lugares para esquecer dela. Tanto que passei parte do encontro e do dia pensando nessa pessoa. Nisso eu concluí que eu precisava ficar na minha. Eu não me sinto confortável em estabelecer novos relacionamentos enquanto a memória do outro ainda está forte para mim. Isso é horrível.

Luca: Aos ouvintes, gostaria de dar um recado muito importante. Se esforcem para não nutrir ódio da pessoa que te deu um fora ou algo parecido. Na maioria das vezes ela só estava expressando algo que ela sente.

Tiago: E a sinceridade é a melhor coisa.

Luca: Exatamente.

Tiago: Eu prefiro muito mais uma pessoa que fala logo que não quer do que alguém que fica te enrolando. Ao ponto que a pessoa começa a te tratar mal para te afastar.

Luca: Por isso eu tenho muita dificuldade de nutrir ódio quando isso acontece, porque foram bons momentos que eu passei com essa pessoa, não tem porque ficar mal.

Tiago: O que resta é a gratidão.

Luca: Ficar mal, eu até entendo. Mas não tem porque ter raiva da pessoa.

Guilherme: É bom ser sincero sempre. Essa coisa de ficar enrolando dentro de um relacionamento e alimentando falsas esperanças só aumenta o sofrimento superior. Passei por isso recentemente, com uma colega da faculdade. Não estava sendo recíproco, nossos horários não batiam e ela só queria se encontrar entre a correria das aulas. Então não estava dando certo, ela não tomava uma posição fingia levar a sério. E eu acabei pondo um fim nisso. E engraçado que passada a ressaca, a pessoa veio querendo voltar a falar comigo.

Luca: Termina antes do carnaval para voltar depois. Mas, quando vocês estão na fossa e querem superar, o que ajuda vocês nesse processo?

Tiago: No meu caso, primeiro a terapia. Pois eu não conseguia entender o processo, eu estava dentro dele. Quando você está numa situação assim você tem sua verdade, a pessoa tem a dela e se tiver um terceiro, tem a verdade dele também. E qual dessas verdades é verdade mesmo? Nenhuma, a realidade é muito mais complexa no que cabe nessas verdades. Então, as vezes para conseguir compreender uma situação assim, você precisa da ajuda de um olhar externo. Então a terapia me ajudou até a retirar o sentimento de culpa que eu sentia. Segundo ponto, chorar. Chorar é importante, é saudável. Pega seu travesseiro, ou ouça músicas tristes. E vai chorando. Terceiro, não se apegue a culpa. Até certo ponto ela é saudável, mas não quando é, ela paralisa a pessoa. Eu assumia até a culpa de coisas fora do meu controle e que não eram culpa minha. Por fim, focar em outras coisas, outras atividades. Em você e sua saúde. É fundamental. E é isso que estou tentando fazer.

Letícia: No meu caso, além do que você falou, acho importante se amar antes de tudo. Eu sempre gosto de me sentir ainda mais bonita quando triste. Faço alguma coisa no cabelo, ou saio para fazer comprar. Ou marco um ensaio fotográfico com algum amigo fotógrafo. Sempre atrás de algo que irá me fazer me sentir bem comigo mesma. Até falar “Puta que pariu, tô gostosa pra caralho.” E quem saiu perdendo foi o cara. Como agora, estou voltando com meus cachos naturais e estou amando isso. Estou com outro ensaio fotográfico marcado para essa semana. E eu nem estou na sofrência. Acredito que esteja na minha melhor fase, em uma amizade colorida muito massa com uma pessoa que me entende.

Tiago: Realmente, amizade colorida é muito bom. Principalmente com alguém que te respeite.

Letícia: Outra coisa importante. É quando você não quiser estar sozinho. É procurar a companhia de pessoas que te fazem bem.  De familiares ou amigos que vão te fazer rir e se distrair. Eu gosto muito de ir para o parque com meus amigos ou ir para casa de um deles beber e jogar alguma coisa. Além de foco no trabalho. Meu trabalho é minha cura. Eu sou muito apaixonada no que faço. E como eu trabalho com arte, isso ajuda muito também. Ao ponto em que esses sentimentos acabam virando objeto de trabalho.

Tiago: Eu acho muito legal essa questão que você falou dos amigos. Nessa situação que eu estou passando eu tenho sentido muita vontade de estar perto dos meus amigos, embora nem sempre seja possível, pela questão do tempo. Mas esse apoio é fundamental.

Luca: Para os ouvintes passando por essa situação. Uma das poucas dicas que posso dar é para não procurar alívio na bebida.

Tiago: O sertanejo vai falar para ir no bar afogar as mágoas, mas não é uma boa ideia não.

Leticia:  Escuta Lana Del Rey, mas não escuta sertanejo não.

Tiago: E como disse o Otávio, ouça Taylor Swift. Apesar que eu acho que tem sertanejos interessantes como “Morto por Dentro”, do Barrerito.

Guilherme: Que isso.

Luca: Tem aquela, “Vamos Desquitar” da Sara Sonaya.

Guilherme: Enfim, tento acompanhar a medicação, para casos depressivos. E ocupar a mente com outras coisas positivas. Ouvir músicas com um tom mais motivacional. Queen, Slipknot. E ter a noção de que existem pessoas numa situação melhor que a nossa e pessoas numa situação pior. E não se achar nem melhor nem pior que elas.

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